31 dezembro 2009

Provedor dos leitores escreve para jornalistas


Naquela que foi a sua última crónica (*) como Provedor do Leitor do Público, Joaquim Vieira "bate" sem caridade na respectiva Redacção, deixando cinco recomendações que mais soam a outras tantas reprimendas:

1. Pensar nos leitores antes de decidir a publicação de cada matéria
- Julgo o Público afectado por certo grau de presunção. Muitas das suas matérias e da sua linguagem são elaboradas em função da superioridade intelectual que os seus jornalistas julgam de bom tom manter

2. Dosear a agenda de interesse público e de interesse do público
- O jornal pensa muito no que julga ser em prol da comunidade, mas pouco no que pode cativar a curiosidade dos leitores

3. Cumprir as regras da produção jornalística, atender ao rigor dos factos e respeitar a língua
- O Livro de Estilo do Público contém directivas que conviria respeitar melhor mas dever-se-ia também pensar na sua própria actualização

4. Considerar também a fotografia como elemento de informação
- A edição fotográfica do Público utiliza muitas vezes a imagem de forma conceptual (um detalhe, uma silhueta, uma sombra, uma mancha, uma forma geométrica, uma sugestão, um enigma) que terá tudo a ver com estética mas pouco com jornalismo

5. Entender o Público não como um jornal em papel com um site integrado mas como uma marca de informação englobando os mais diversos suportes.
- A democracia precisará sempre do jornalismo, mas vai deixar de precisar dos jornais
(*) in Público, 27 Dez 2009

Aqui dirigidas aos jornalistas do Público, estas cinco recomendações de Joaquim Vieira apontam para outros tantos (e controversos) problemas do jornalismo em geral, quer ao nível da prática profissional quer no campo do seu estudo académico. Mas a (louvável) frontalidade com que são descritas pelo Provedor, pode também fazer parecer que os jornalistas do Público têm a mania de que são mais do que os leitores, borrifam-se para a curiosidade (ou interesse) de quem compra o jornal, distorcem os factos, dão calinadas na língua e manipulam as fotografias.

Por isso, e também porque, como o próprio Joaquim Vieira reconhece na sua derradeira crónica, à actividade de provedor é inerente "a diferença de pontos de vista entre escrutinador e escrutinado", será de esperar uma reacção dos jornalistas do Público, porventura, tão frontal como a crítica do Provedor
.
Aguardemos.

27 dezembro 2009

Um pianista que até fala

"Sou compositor, um óptimo pianista, mas como chefe de orquestra sempre fui medíocre"

António Victorino D'Almeida, Actual, Expresso, 19 Dez 2009

Duvido que seja um chefe de orquestra medíocre. Mas não só é um óptimo pianista como, tendo em conta os seus famosos programas da televisão e as palestras que tem feito pelo país fora, pode dizer-se, com toda a propriedade: é um pianista que até fala.

O emprego a ir ao fundo

"Porque é que se dá dinheiro a alguém sem lhe pedir trabalho em troca?"

"Porque é que se subsidia algo indesejável, como o desemprego, e não se subsidia algo desejável como é o emprego?"


Magalhães Pinto in "Vida Económica", 11 Dez 2009

O observador exterior e descomplexado

Da coluna de Fernanda Câncio, no Notícias Magazine de hoje, retive os dois pequenos excertos a que me passo a referir:

1.
“2009 foi um ano muito estranho. (…) Nunca tínhamos assistido a algo assim: uma presidência que se diz vigiada pelo governo, um braço-direito de um presidente que encomenda notícias contra o governo, um presidente que faz o discurso mais trôpego e sinuoso de que há memória num presidente"

Pode a Fernanda Câncio ter assistido a essas estranhezas todas. Mas a julgar pelo imaculado silêncio a que nelas vota o Governo e o Primeiro-Ministro, até leva a crer que tapou primeiro um dos olhos. Se assim foi, já não admira que também só tenha visto um dos lados. Quer, dizer, numa Jornalista, admira, sim senhora. Daí, o reparo.

2.
"A criação de uma ideia de falha na democracia, de «menos democracia», levou a acusações inflamadas sobre media controlados, sobre «pensamentos únicos», perseguições e pressões. Independentemente de qualquer tentativa de controlo - a provar -, porém, um observador exterior e descomplexado que se dedicasse a observar os media portugueses só podia ter uma opinião bem diferente".

Independentemente de qualquer tentativa de controlo - como diz a Jornalista – também creio que não se deve “confundir com censura o recurso dos cidadãos às instâncias postas ao seu dispor pela democracia e pelo Estado de Direito sempre que considerem que o seu direito ao bom nome ou qualquer outro direito da personalidade foi posto em causa pelos media.” Mas é fácil concordar quando se trata assim de uma premissa abstracta e geral. Saber se é isso que está a acontecer na situação particular em apreço, já são outros quinhentos. É uma questão ideal para a retórica crítica, que submete as melhores razões ao critério da razoabilidade e do consenso. Mas aqui a minha dúvida é outra:
- estará Fernanda Câncio a ser, num e noutro caso, uma observadora tão exterior e descomplexada como ela própria assertivamente requer para um “observador exterior e descomplexado” que, diz, “só podia” ter a mesma opinião?

26 dezembro 2009

O playback ao contrário

O registo desta mensagem de Natal do Primeiro-Ministro - proferida em (falso) improviso, com um olho na câmara e outro no teleponto (*) - tem um sério inconveniente: fica-se com a sensação de que o conteúdo da mensagem é (foi) tão artificial como a forma.
Não é preciso recorrer a Levinas para situar a importância do rosto na relação com o outro. O rosto ou a face é o que temos de mais identitário. É a nossa assinatura, o nosso compromisso pessoal. Expressões como "olhos nos olhos", "sorriso amarelo" ou "cara de poucos amigos", atestam o valor informativo que o rosto melhor sinaliza do que a mais rebuscada literalidade.
Quando o Primeiro-Ministro vai à televisão ler disfarçadamente uma mensagem de Natal, não comete apenas uma deselegância para quem se dispôs a vê-lo (e não apenas a escutá-lo). Ao afastar o olhar da câmara (isto é, de quem o olha) priva o telespectador de confirmar coisas tão decisivas para o sentido de uma comunicação como a sinceridade, a convicção ou o entusiasmo de quem fala. E lá está: não me parece que isso seja bonito. Para além de que, se em televisão bastasse o conteúdo informativo da mensagem, então bem poderia ter sido lida por outro. Por mim, quase prefiro o playback. Ao menos teríamos o Primeiro-Ministro a olhar para nós. Que diferença faz, afinal, entre fingir que se fala e fingir que não se lê?

(*) A que já aqui me referi

19 dezembro 2009

Cavaco converte-se à retórica

É grande o inverno demográfico no nosso país - afirmou hoje Cavaco Silva. Ora a expressão "inverno demográfico" foge aqui à literalidade para melhor persuadir. E é, aliás, esse propósito de persuasão que, por um lado, a legitima e absolve de uma aparente incorrecção gramatical e, por outro, a torna numa figura de retórica (e já não somente numa figura de estilo).

Trata-se, é claro, de um inverno metafórico, que de verdadeiro inverno nada tem mas que, no actual contexto, melhor acentua e dramatiza a situação demográfica, no caso, a fraca taxa de natalidade. Mas não é a preocupação do sr. Presidente que me surpreende. O que me surpreende, é vê-lo converter-se à "mera retórica"
que tem criticado nos outros .

16 dezembro 2009

Pacheco na TV

O "Ponto Contra Ponto" do passado domingo, melhorou, mas pouco. Assim, como está, quero dizer, assim como continua, parece um programa para a rádio. Nada a opor contra o conteúdo que, como seria de esperar do autor, é bem polémico e por isso mesmo, também, muito interessante. Mas a forma, está longe de poder "passar" satisfatoriamente na televisão.

Pacheco vem melhorando o seu relacionamento com o teleponto (ou seja lá que auxiliar de memória for), mas ainda mantém por demasiado tempo o olhar afastado da câmara enquanto fala (apesar de para ela continuar de frente) como se estivesse a ler (mesmo que não esteja). Em rádio poderia, sem problema algum, fixar a atenção sobre o texto durante todo o programa, mas em televisão, sabe bem, estou certo, que não pode olhá-lo mais do que por breves e sucessivos relances, para saber o que dirá ao telespectador em seguida, olhos nos olhos. O que não é tarefa fácil, reconheço, para além do treino e da disponibilidade a que obriga.

Mas ou Pacheco Pereira aperfeiçoa um pouco mais a sua relação com o texto e com a câmara - para não parecer que está a ler um guião - ou, definitivamente, será mais indicado recorrer a uma estratégia de realização alternativa. Estou a pensar, por exemplo, em passar a ler palavra por palavra só enquanto a câmara mostra diferentes tipos de documentos ou ilustrações (filmes, fotos, mapas, esquemas, gráficos, textos, etc.) e em sempre que aparecer no ecrã, falar com a naturalidade do pequeno improviso (previamente estudado, bem entendido). Pode o discurso resultar menos certinho, mais hesitante, menos corrido, mas seguramente que se tornará mais vívido e atractivo. Muito melhor, portanto.

15 dezembro 2009

Será o opinador um irresponsável?

Corre, no entanto, uma interessante teoria que defende o princípio da inimputabilidade para quem escreve textos de opinião. Ou seja, designa-se um texto ou um comentário numa qualquer estação de rádio ou televisão como opinião, e está automaticamente passada uma espécie de autorização para se dizer tudo o que vem à cabeça. Não há qualquer tipo de limites. Neste espaço, eu posso chamar ladrão a quem me apetecer, posso acusar qualquer cidadão dos mais terríveis e sórdidos crimes, posso pôr em causa a honra ou a probidade de alguém, posso inventar factos ou mentir descaradamente sem que tenha de me preocupar com as consequências das minhas afirmações. É assim como uma espécie de inversão do ónus da prova só ao dispor dos opinadores.

Pedro Marques Lopes,
Mártires da opinião, Diário de Notícias, 12 Dez 2009.

Diz o
Filipe Nunes Vicente que esta crónica do Pedro Marques Lopes é dirigida ao Pedro Lomba. Será. Mas, do meu ponto de vista, mais importante é ainda colá-la a todos os críticos, comentadores ou analistas que subscrevem o aludido "princípio da inimputabilidade para quem escreve textos de opinião". Porque é um princípio absurdo.

Um cronista não pode começar a sua crónica num registo intencionalmente analítico, lógico, verdadeiro, remetendo o leitor para idênticas instâncias de recepção, e, a páginas tantas, sem aviso prévio, mudar para um estilo literário de pura ficção ou pior ainda, passar a dizer toda a série de disparates que lhe vêm à cabeça.

Um cronista não pode começar a sua crónica com pezinhos de lã e lá mais para diante pôr-se a difamar ou ofender seja quem for e, no final, querer fugir à responsabilidade pelas afirmações que produziu, sob o pretexto de que se limitou a exprimir uma opinião.

Um cronista não pode agir perante os seus leitores como se a opinião fosse tão só uma descarga de subjectividade, porque não é. Se a opinião fosse apenas subjectividade, capricho ou irracionalidade mais ou menos voluntarista, se a opinião fosse algo que só o próprio opinador estivesse em condições de perceber, com que legitimidade alguém opiniaria? Quem se interessaria por uma opinião exclusivamente subjectiva e, portanto, inoponível?

14 dezembro 2009

Como no mundo não há igual

Ou muito me engano ou Sócrates ainda irá pagar caro esta sua tendência para a retórica da amplificação epidíctica. Quando um primeiro-ministro, por tudo e por nada, desata a amplificar a obra do seu Governo é porque sente que isso é necessário. Mas, ao mesmo tempo, se sente que isso é necessário é porque a obra, afinal, não é tão evidente quanto ele pensa ou quer fazer crer. Neste caso, não estaria indicado um pouco mais de reserva? Já não digo ficar caladinho que nunca gostei de pedir "impossíveis".

Alegre fora de si

Diz que uma decisão sobre a sua possível candidatura presidencial não está dependente de outros. Mas, como destaca José António Lima, no "Sol", "voltou a ocupar o espaço mediático nos últimos dias, com entrevistas, colóquios, prefácios de livros, jantares e declarações avulsas".

Diz que "qualquer decisão sobre uma [a sua] candidatura presidencial não está dependente dos outros, mas ainda não encontrei a resposta dentro de mim", o que, desde logo, sugere a necessidade de algum recolhimento. Mas ainda na passada sexta-feira se deslocou ao Entroncamento para mais um encontro com apoiantes da sua candidatura a Belém em 2006.

Mas que coisa. Como é que alguém que afirma ter a resposta dentro dele surge cada vez mais fora de si?

13 dezembro 2009

Quem não quer ser democrático não lhe veste a pele

A propósito do anúncio do vencedor do concurso do primeiro troço ferroviário de alta velocidade, o Editorial do "Público" de hoje (que chatice não ser assinado) avisa que o debate só agora está a sair da estação pois há dois discursos quanto ao TGV: um discurso da oposição (contra) e um discurso do Governo (a favor ). Adianta(m) o(s) nosso(s) anónimo(s) editorialista(s) que tudo depende da forma como vão evoluir o combate ao desemprego e o problema do endividamento.

Tecnicamente não pesco nada do assunto pelo que o deixo para os entendidos. Mas aproveito esta referência aos dois discursos sobre a mesma obra (TGV) para estranhar que o Governo se dê tão mal com a sua inevitabilidade e venha fazendo um verdadeiro "drama" sempre que a oposição não comunga das suas ideias. Pergunto-me mesmo quando é que o Governo e, em particular, José Sócrates, deixa de responder às críticas da oposição com verdadeiros ataques ao seu direito de discordar.

Vamos lá ver: quem não quer ser democrático não lhe veste a pele. O que caracteriza um regime democrático é precisamente tolerar uma oposição, é aceitar a legitimidade de um discurso contrário ao do poder constituído. Como lapidarmente mostrou Protágoras na sua teoria do duplo discurso, "a respeito de tudo há dois discursos que se contradizem um ao outro". Não se vê que a política pudesse ser uma primeira excepção.

12 dezembro 2009

Isto está a ficar bonito

Custa-me dizê-lo mas já não me espanta que haja entre os nossos políticos quem seja um palhaço e quem se venda por qualquer preço. O que me espanta é que nem sequer guardem segredo disso. Isto está a ficar bonito.

O único país do mundo (a falhar)?

Agradeço esta muito simpática referência do Vasco Campilho que, a propósito do estilo do "homem dos cobertores", avança com uma pertinente pergunta quase-retórica: "Mas se Portugal for o único país no mundo a desenvolver a tal rede [de abastecimento dos futuros carros eléctricos], não quererá isso dizer que se trata de um investimento falhado, de uma via sem saída, de (mais) um elefante branco?". Boa pergunta, caro Vasco.

09 dezembro 2009

Qualquer coisa

Depois de ter visto um cientista dizer hoje à tarde na TV, a propósito da cimeira de Copenhaga, que o aquecimento global subiu "qualquer coisa como 0,6 %" - qualquer coisa como, disse ele - sou levado a duvidar do rigor dos actuais estudos científicos sobre o assunto. Outra coisa que também me mete alguma impressão é que tanto se fale no aquecimento por (má) intervenção humana e nunca se equacione ou meta nas contas o que eventualmente derive de causas naturais. Ou será que sou qualquer coisa como desconfiado?

08 dezembro 2009

O estilo do "homem dos cobertores"

Hoje lembrei-me de um tempo de criança, de quando a minha mãe me levava todos os sábados de manhã ao muito concorrido mercado da Senhora da Hora, na rua da "igreja velha", e eu aproveitava o tempo que ela se demorava nas compras para me aproximar imediatamente do "homem dos cobertores", um propagandista que me deixava completamente hipnotizado. Mas é melhor pintar primeiro o quadro.

Aquilo não era um vendedor, era um artista. Sentado em cima do tejadilho da sua furgoneta ao lado dos vistosos lotes de colchas e cobertores que pretendia impingir - e para os quais não parava de chamar a atenção - fazia do microfone o que queria. Ora gritava como se estivesse a kilómetros, ora sussurrava quase ao ouvido. Se fosse preciso, cantava. Se fosse preciso, ria. Se fosse preciso, chorava. Prendia a atenção de todos, procurava o olhar de cada um. O registo era assertivo mas também sempre muito amigável, cuidadoso, educado. Tinha o seu ethos sob rigoroso controlo. Representava como se estivesse num palco. E estava. No palco da sua vida.

Para compor o "espectáculo", recorria a um sem número de técnicas. Uma delas consistia em justificar o baixo preço dos seus artigos dizendo (em voz baixa) que os comprara a uma fábrica da Covilhã que tinha ardido. Não faço hoje a menor ideia de quantas vezes terá ardido essa fábrica que, por certo, nunca existiu.


Outra técnica, de grande efeito, consistia em dar antes de receber. E esse era o momento por que todos esperavam: os que não lhe queriam comprar nada (muitos) e os que admitiam comprar algo (poucos). Indiferente ao risco, sujeitando-se a dar tudo em troca de nada, o nosso "homem dos cobertores" iniciava a distribuição por todos de variados artigos, dos sabonetes aos pentes, das tesouras aos bordados, dos lenços às tolhas de mesa, etc., etc. E por mais estranho que pareça, pelo menos de todas as vezes a que assisti ao seu show, conseguiu sempre "despachar" o artigo todo. Escapa-me agora, porventura, a que última técnica terá recorrido para atingir o seu grande objectivo - vender os cobertores.

A única coisa que recordo, desse momento conclusivo, é que ele começava por pegar num só cobertor, depois noutro, depois noutro ainda, mais um e mais outro e ia acompanhando cada gesto com aquele estafado palavreado que pelos vistos continua a resultar: "não leva um, não leva dois e nem leva três, vai levar quatro cobertores pelo preço de um".

Foi este fabuloso propagandista que me veio à cabeça quando escutei hoje no noticiário das 14 h da TSF, o nosso Primeiro-Ministro a anunciar a futura rede de abastecimento de carros eléctricos nestes precisos termos:

"Portugal deseja ser o único país no mundo, muito em breve, a ter o uma rede local de abastecimento e ou de carregamento, não uma rede numa cidade, mas uma rede verdadeiramente nacional que abranja todo o território nacional"

Será que o "homem dos cobertores" já antecipava o estilo?

06 dezembro 2009

Ponto contra teleponto

Só muito recentemente pude começar a ver o opinativo programa de Pacheco Pereira na SIC-Notícias, o Ponto/Contraponto. Tudo o que Pacheco diz ou escreve interessa-me, mas sobre o programa ainda não formei opinião.
No que já reparei foi na sua falta de jeito para lidar com o teleponto e no efeito visualmente nefasto que daí decorre. A gente olha para o ecrã e vê-o a falar de frente para nós mas, ao mesmo tempo, olhando constantemente para outro lugar, o que para além de não ser bonito, dificulta a própria recepção.
Que fazer? Das duas uma: ou passa a interagir mais naturalmente com o teleponto ou é melhor colocá-lo em rodapé no ecrã para que o telespectador tenha, também ele, para onde olhar. De contrário, é um convite à distracção, mesmo para quem está interessado em segui-lo.

Troca por troca

E pôem-se assim a dar estas notícias sem pés nem cabeça: que culpa tem o senhor primeiro de estar sujeito a escuta no momento em que precisou de trocar o seu telemóvel? Ainda não percebi a ligação. Estarei muito lento?

O Governo e a coligação negativa

A última semana tem sido dominada por uma des­sas expressões redutoras, utilizada a propósito e a despropósito: "coligação negativa". Não há intervenção de membro do Governo ou do primeiro-ministro que não alerte para o risco de uma "coligação negativa" paralisar o país. Ou de aumentar o défice. Ou de impedir o Governo de cumprir o seu programa.

José Manuel Fernandes, Público, 4 Dez 2009
Concordo inteiramente com José Manuel Fernandes quando diz que "uma das formas mais eficazes de condicionar o debate político é colocá-lo em termos que tornam difícil pensar", mas já não comungo da sua perplexidade perante o reiterado uso governamental da expressão "coligação negativa".

É que, como ele próprio diz na parte final do seu artigo no Público da passada sexta-feira, convém "saber o que é essencial e o que é secundário em cada debate". E o essencial aqui é que o Governo, vendo que uma estratégica e "interessada" coligação dos diferentes partidos da oposição dificulta ou mesmo impede a execução do seu programa, veio alertar para a gravidade da situação a que isso nos pode conduzir, incluindo, a própria ingovernabilidade. Sem partidarite: o que é que isto tem de condenável? Mais: se o Governo forçosamente tinha de se referir à coligação que lhe nega a execução do programa, teria alguma lógica apelidá-la de "coligação positiva"?

Este Governo fez (e faz), neste aspecto, o que qualquer outro governo faria, dado que o problema é político e não epistemológico. Ora um problema político requer uma comunicação política. E a comunicação política ou é persuasiva ou não é nada. Reconheça-se, pois, que a expressão "coligação negativa" foi muito bem apanhada e é precisamente por se revelar tão persuasiva que serve de assunto (principalmente, a quem se opõe ao Governo).