17 julho 2007

Excerto de um livro não anunciado (385)

Mas porque consideramos que são as acusações de que a retórica não passa de um instrumento de engano e manipulação que mais têm contribuído para o generalizado descrédito em que a mesma ainda se encontra, entendemos que a questão justificava uma atenção muito especial neste nosso trabalho. E a principal ideia que formamos foi a de que a retórica, mais do que uma prática discursiva especialmente favorável para induzir o outro ao engano, constitui, isso sim, um espaço de discutibilidade e afirmação das subjectividades em presença que, por si só, garante ao auditor a possibilidade de dizer não e, inclusivamente, de justificar a sua recusa. Para tanto, basta que a competência argumentativa não seja um exclusivo do orador e se estenda igualmente ao auditório a quem se dirige, pois também só nessa condição se poderá verdadeiramente falar de uma situação retórica, no sentido perelmaniano. Sem a competência argumentativa é a própria ética da discutibilidade que perde todo o sentido. Sem a discutibilidade não há sequer argumentação, nem tão pouco seria precisa. Neste caso, o destinatário da mensagem, pura e simplesmente, passa de receptor a mero receptáculo.