Confiança política?
A propósito do Governo ter anunciado o início de uma reforma da administração pública, António Barreto traz ao seu "Retrato da Semana", no Público de hoje, o caso muito especial da confiança política em nome da qual, sempre que um partido ganha as eleições desata a nomear "centenas e centenas de directores gerais, presidentes, gestores e outros" e, naturalmente, a demitir outros tantos. Trata-se, sem dúvida, de um verdadeiro problema, ao qual talvez nenhum de nós deva ficar alheio. Por mim, percebo sem dificuldade que os novos governantes precisam de ter nos mais altos cargos da administração gente da maior confiança pessoal e profissional. Quer dizer, gente de carácter e competência tão inquestionáveis, que por si só, permitam fundadamente antever e esperar a melhor execução possível dos projectos, medidas ou meras orientações políticas traçadas pelo governo. Mas já tenho sérias reservas quanto à necessidade da aludida confiança política num director-geral quando, como se sabe, os próprios governos dos dois maiores partidos portugueses têm contado com vários ministros "independentes". Pode ser que este invocado conceito de confiança política seja mais nebuloso do que estou a pensar, mas ainda assim, ou até precisamente por isso, o alerta de António Barreto parece fazer todo o sentido e reclamar a nossa atenção urgente. Principalmente porque "essa regra serve, entre nós, para tornar o Estado refém dos partidos vencedores. É por causa dessa malfadada regra que (...) se dá para toda a administração o exemplo do arbitrário e do favoritivismo (...). Que se tolhe, cada vez mais, a competência da administração, que assim vive sob a tutela dos gabinetes políticos e nem sequer assume as suas responsabilidades. Que nao se conseguem estabelecer as fundações de uma razoável autonomia administrativa. E que a administração vive e vegeta cativa do governo e não responde perante a sociedade ou outras instituições (como o Parlamento, por exemplo). Se esta reforma da administração pública não atacar, com energia, a questão da confiança política, podemos rezar-lhe pela alma". Aguardemos...
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