02 março 2004

Excertos de um livro não anunciado (175)

(...) Tanto basta para que se tenha de reconhecer que no campo da argumentação, um facto ou uma verdade nunca têm o seu estatuto definitivamente assegurado, excepto quando se admita a existência de uma autoridade infalível ou divina. Sem a garantia absoluta que decorreria desta última, todos os factos e verdades poderão então ser postos em causa, independentemente de serem admitidos como tais pela opinião comum ou pela opinião de especialistas. Sublinhe-se, contudo, que, "se o acordo a seu respeito for suficientemente geral, ninguém os pode ignorar sem se tornar ridículo, a menos que forneça razões capazes de justificar o cepticismo a seu propósito" *. Nesse caso, ao oponente não resta outra posição que não seja a de tentar desqualificar os factos ou verdades apresentadas pelo orador mas que não merecem a sua aprovação. E a forma mais eficaz de desqualificar um facto ou uma verdade é, segundo Perelman, "mostrar a sua incompatibilidade com outros factos e verdades que se afiguram mais seguras, e mesmo, de preferência, com um feixe de factos ou de verdades que não se está preparado para abandonar" ** (...)


* Perelman, C., (1993), O Império Retórico, Porto: Edições ASA, p. 44
** Idem