04 abril 2006

Excerto de um livro não anunciado (302)

Ora persuadir (do lat. persuadere) é isso mesmo, convencer, levar alguém a crer, a aceitar ou decidir (fazer algo), sem que daí decorra, necessariamente, uma intenção de o iludir ou prejudicar, tão pouco a de desvalorizar a sua aptidão cognitiva e accional. Pelo contrário, o acto de persuadir pressupõe um destinatário que compreenda e saiba avaliar os respectivos argumentos, o que implica reconhecer o seu valor como pessoa, como centro das suas próprias decisões. Não subscreveríamos, por isso, a afirmação de Pedro Miguel Frade de que “o discurso persuasivo parte sempre, em primeira mão, de uma desqualificação mais ou menos assumida das capacidades e dos propósitos do outro” (os sublinhados em itálico são nossos) (*). Porque na “interacção a dois” (a que este mesmo autor se refere), a persuasão não tem que significar a desqualificação do persuadido mas sim um confronto de opiniões, onde os argumentos ou razões invocadas tanto podem merecer acolhimento como serem liminarmente refutados. Como em tantas outras situações comunicacionais, a manipulação sempre pode instalar-se nos discursos persuasivos. Condenar, porém, a persuasão em abstracto, seria um juízo a priori muito semelhante ao de admitir uma ilicitude sem ilícito.

(*) Pedro Miguel Frade, "Comunicação", in Carrilho, M. (Org.), (1991), Dicionário do Pensamento Contemporâneo, Lisboa: Publicações D. Quixote, p. 52