29 agosto 2007

Excerto de um livro não anunciado (392)

Teremos assim, não só uma retórica dos sujeitos mas também para os sujeitos. Sujeitos que por ela procuram afirmar ou superar as suas diferenças em direcção a um consenso que lhes permita ultrapassar os obstáculos próprios de uma caminhada feita de vida em comum. Pelo confronto de opiniões, pela discussão e escolha dos valores que possam merecer o acordo do outro ou da respectiva comunidade, a retórica promove o entendimento entre os homens, engendra e modela novas formas de sociabilidade. É esse seu regime de liberdade que, afastando o recurso quer à violência quer ao poder ditatorial, lhe pode conferir um lugar proeminente no exercício da própria cidadania. Mas para isso, seria necessário que a retórica deixasse de ser um exclusivo de alguns, dos homens de marketing, das vendas, da publicidade, da política ou dos media e passasse a integrar a competência argumentativa dos seus próprios destinatários. Numa cultura democrática as diferentes opções de cada qual pressupõem uma igualdade de acesso à compreensão dos saberes, nomeadamente, dos que respeitem ao acto comunicativo. E, deste ponto de vista, o conhecimento retórico não pode nem deve constituir-se como excepção. A chamada “face negra” da retórica não se inscreve nela própria mas sim num elemento que lhe é exterior: a ignorância ou má-fé de quem dela se serve ou com ela se confronta. Seria por isso desejável que o actual recrudescimento do interesse teórico pela retórica pudesse servir de plataforma para a sua divulgação e estudo teórico-prático mais generalizado, a começar, no interior do próprio sistema de ensino oficial. Pode acontecer que esta sugestão, como de resto todo o texto do estudo que acabamos de apresentar, não passe de retórica. Mas sabemos agora que a nada mais poderíamos aspirar.

FIM
Sousa, Américo de (2001), A PERSUASÃO, Covilhã, Editora Universidade da Beira Interior
Sousa, Américo de (2003), A PERSUASÃO-ESTRATEGIAS DA COMUNICAÇAO INFLUENTE, Rio de Janeiro, Editora Nórdica