18 julho 2003

Mourinho joga de cabeça

Há muito que venho notando o importante papel que o treinador de futebol José Mourinho reserva à retórica quer no relacionamento com os jogadores e dirigentes do seu clube quer no contacto com os jornalistas. Ainda assim, confesso a minha surpresa ao saber que Mourinho, numa atitude que tudo leva a crer seja inédita no futebol português, acaba de enviar uma carta a cada jogador. Isso mesmo: uma carta. O ponto é que, neste caso, remetente e destinatário não estão separados nem pelo espaço nem pelo tempo. Antes se encontram diariamente no campo de treinos, onde o treinador não teria qualquer dificuldade em chamar os atletas um a um e comunicar-lhes a mesma mensagem, de olhos nos olhos. Mas Mourinho terá pretendido que a dita mensagem permaneça no tempo, pelo menos, por toda a época em curso e decidiu-se pela carta. Não se conhece exactamente o seu teor, mas seguramente que visa efeitos persuasivos ou retóricos. Simplesmente a retórica, como se sabe, obriga a uma prévia sintonia ou adaptação ao auditório (neste caso, aos atletas) sob pena do discurso, ainda que bem fundamentado, vir a revelar-se totalmente ineficaz. Terá Mourinho observado esta regra funfamental da retórica? Vejamos. A primeira reacção conhecida, vem hoje no Público e não é nada encorajante: "Ainda não li a carta toda; é muito grande." - desabafa o jogador Ricardo Carvalho. Uma interrogação fica, por isso, no ar: não estará Mourinho a insistir demais no jogo de cabeça?