Serão os blogues um verdadeiro acontecimento? (2)
(continuação do post anterior)
Sou um leitor compulsivo de Eduardo Prado Coelho. Admiro tanto a sua quase temível erudição como, principalmente, o que faz com ela. É, provavelmente, a pessoa que em Portugal melhor diz e faz retórica. Retórica, aqui, no seu sentido mais nobre, isto é, como ciência da argumentação ou persuasão discursiva. Outra coisa é, claro, concordar ou não com os seus pontos de vista. Desta vez, não estou de acordo. Vejamos porquê:
Em primeiro lugar, EPC começa por afirmar que os blogues e o chá verde são duas realidades "extremamente importantes". Repare-se: não apenas importantes, mas muito mais que isso, extremamente importantes. Seria de esperar então que mais adiante justificasse tal afirmação ou que, no mínimo, não a pusesse em causa. Mas o que EPC faz, de imediato, é uma comparação do que acontece nos actuais blogues com o que se passava, segundo diz, no espaço mediático de "outrora", comparação esta que objectivamente visa desvalorizar os blogues inicialmente exaltados. Para o efeito, põe em causa a legitimidade (ou competência?) de quem neles escreve, ao mesmo tempo que lança o anátema da falta de um controlo de qualidade, quando opina, por exemplo, que, na blogosfera, "Não é preciso articular bem os textos". Ora, salvo melhor opinião, daqui decorre uma notória contradição lógica entre a afirmação inicial de que os blogues são "extremamente importantes" e a aberta condenação a que os sujeita na parte final da sua crónica.
Em segundo lugar, o argumento do autor do blogue "sentir-se autorizado a" escrever sobre todos os assuntos que lhe interessam parece, em grande medida, irrelevante, pois no que toca à "complexa malha das legitimações" nem a sua ausência nos blogues se traduz, necessariamente, por falta de legitimidade (e competência) para neles escrever seja o que for, nem a sua existência no espaço mediático de "outrora" a outorgava automaticamente.
Quanto ao mais, dizer que nos blogues "Não é preciso articular muito bem os textos. Pode ser uma observação verrinosa, um comentário sardónico. Pode usar toda a agressividade que quiser, porque isso faz parte das regras do jogo", só se compreende se conjugado com a confissão de que "nem mesmo leio com regularidade os blogues dos outros. Não tenho tempo". Porque, basicamente, o problema não difere: se o autor de um blogue quer ser lido, tem que se adaptar e agradar ao auditório. Tal como um jornal tradicional tem que responder aos interesses do seu público-alvo. Mas afirmar que, nos blogues, usar toda a agressividade que quiser faz parte das regras do jogo é algo que só estará ao alcance de quem não ande mesmo por cá.
Por último, não há já qualquer dúvida de que os blogues sejam um acontecimento. Muito menos se o único critério a considerar for o de condicionarem o que se pensa e escreve. O caso parece-me tão evidente que só avançaria para a prova se ela viesse a ser suscitada. Mas julgo que só não se dá conta disto quem não edita um blogue, o que é natural. Falta, isso sim, é caracterizar adequadamente este acontecimento. E essa é uma das tarefas que está em curso, nomeadamente, no seio do já tão famoso metabloguismo. Aguardemos, então.
Sou um leitor compulsivo de Eduardo Prado Coelho. Admiro tanto a sua quase temível erudição como, principalmente, o que faz com ela. É, provavelmente, a pessoa que em Portugal melhor diz e faz retórica. Retórica, aqui, no seu sentido mais nobre, isto é, como ciência da argumentação ou persuasão discursiva. Outra coisa é, claro, concordar ou não com os seus pontos de vista. Desta vez, não estou de acordo. Vejamos porquê:
Em primeiro lugar, EPC começa por afirmar que os blogues e o chá verde são duas realidades "extremamente importantes". Repare-se: não apenas importantes, mas muito mais que isso, extremamente importantes. Seria de esperar então que mais adiante justificasse tal afirmação ou que, no mínimo, não a pusesse em causa. Mas o que EPC faz, de imediato, é uma comparação do que acontece nos actuais blogues com o que se passava, segundo diz, no espaço mediático de "outrora", comparação esta que objectivamente visa desvalorizar os blogues inicialmente exaltados. Para o efeito, põe em causa a legitimidade (ou competência?) de quem neles escreve, ao mesmo tempo que lança o anátema da falta de um controlo de qualidade, quando opina, por exemplo, que, na blogosfera, "Não é preciso articular bem os textos". Ora, salvo melhor opinião, daqui decorre uma notória contradição lógica entre a afirmação inicial de que os blogues são "extremamente importantes" e a aberta condenação a que os sujeita na parte final da sua crónica.
Em segundo lugar, o argumento do autor do blogue "sentir-se autorizado a" escrever sobre todos os assuntos que lhe interessam parece, em grande medida, irrelevante, pois no que toca à "complexa malha das legitimações" nem a sua ausência nos blogues se traduz, necessariamente, por falta de legitimidade (e competência) para neles escrever seja o que for, nem a sua existência no espaço mediático de "outrora" a outorgava automaticamente.
Quanto ao mais, dizer que nos blogues "Não é preciso articular muito bem os textos. Pode ser uma observação verrinosa, um comentário sardónico. Pode usar toda a agressividade que quiser, porque isso faz parte das regras do jogo", só se compreende se conjugado com a confissão de que "nem mesmo leio com regularidade os blogues dos outros. Não tenho tempo". Porque, basicamente, o problema não difere: se o autor de um blogue quer ser lido, tem que se adaptar e agradar ao auditório. Tal como um jornal tradicional tem que responder aos interesses do seu público-alvo. Mas afirmar que, nos blogues, usar toda a agressividade que quiser faz parte das regras do jogo é algo que só estará ao alcance de quem não ande mesmo por cá.
Por último, não há já qualquer dúvida de que os blogues sejam um acontecimento. Muito menos se o único critério a considerar for o de condicionarem o que se pensa e escreve. O caso parece-me tão evidente que só avançaria para a prova se ela viesse a ser suscitada. Mas julgo que só não se dá conta disto quem não edita um blogue, o que é natural. Falta, isso sim, é caracterizar adequadamente este acontecimento. E essa é uma das tarefas que está em curso, nomeadamente, no seio do já tão famoso metabloguismo. Aguardemos, então.
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