08 agosto 2003

Tipologia geral das polémicas

O diálogo - graças ao regime eminentemente democrático do "agora falas tu que depois falo eu" - é, talvez, a forma mais natural e apaixonante de se comunicar. Só que tanto pode levar à descoberta das semelhanças como à confirmação das diferenças. Não admira, por isso, que o "entrar em diálogo" tantas vezes resulte em polémica. Nos blogues já tivemos também as "nossas" polémicas, sendo de prever o aparecimento de muitas mais. Daí que me pareça oportuno fazer subir ao palco a tipologia geral das polémicas de Marcelo Dascal *, a qual constitui, em minha opinião, uma estrutura-guia de grande utilidade em qualquer tipo de debate.

Para Dascal, são três os grandes tipos de polémicas: a discussão, a disputa e a controvérsia.

A discussão. Tem como objectivo determinar a verdade e para esse efeito serve-se da prova. É aquele tipo de polémica onde os adversários já repartem os pressupostos, métodos e objectivos que lhes permitem resolver a situação. Exemplo: dois matemáticos podem ter diferenças de opinião a respeito da demonstração de um teorema. Mas se um deles mostra que o outro cometeu um erro na sua demonstração a questão fica decidida.

A disputa. Aqui o objectivo é apenas o de vencer. Já não se decide por convenção racional, quando muito será por uma intervenção externa: um sorteio, um mediador ou o tribunal. Cada um dos disputantes aceita a decisão imposta mas isso em nada altera a sua convicção sobre quem tem de facto razão.O instrumento utilizado é o chamado estratagema, com o que se procura fazer calar o adversário e levar assim o auditório a pensar que ele foi derrotado. Pode até ter uma aparência de inferência lógica mas não respeita, de facto, as leis da lógica.

A controvérsia. O seu objectivo é convencer e o instrumento de que se serve é o argumento.


Naturalmente que é este último tipo de polémica - a controvérsia – o que coincide com a retórica crítica que defendo. E se quisermos comparar com os dois tipos de polémica anteriores, poder-se-á dizer que a controvérsia (retórica ou argumentação) nem é decidível como a discussão, nem é indecidível como a disputa.


Nota- Marcelo Dascal elaborou esta tipologia com base naquilo que observou, não na esfera político-partidária, nem nas apaixonadas discussões promovidas pelos “media”, mas sim, no interior da própria prática científica.


* Marcelo Dascal é epistemólogo na Faculdade de Humanidades da Universidade de Tel Aviv e um dos autores da obra “A ciência tal qual se faz”, publicada, em 1999, sob os auspícios do Ministério da Ciência e Tecnologia e coordenada por Fernando Gil