09 maio 2006

Sem canalhice

A entrevista que Freitas do Amaral concedeu ao Expresso teve assinalável repercussão blogosférica e no essencial estou de acordo com o que foi dito, por exemplo, no Bloguítica, no Misantropo Enjaulado, no Glória Fácil, no Portugal dos Pequeninos e no Blogouve-se. Mas já não com o que o Prof. Vital Moreira afirma no seu Causa Nossa:

A manchete do Expresso sobre Freitas do Amaral é uma pequena canalhice jornalística: uma coisa é um ministro dizer que a sua agenda é fatigante, outra é dizer que está cansado do lugar.

É que:

1.
O título do Expresso não refere "cansado do" mas sim "cansado no".

2.
Foi Freitas quem disse à jornalista que chega ao fim do dia completamente estoirado (e não apenas cansado). O jornal (ao menos, desta vez) não inventou nem tão pouco especulou. O que se diria se o título tivesse sido, por exemplo, "Freitas estoirado no MNE"? E, não obstante, o conteúdo da entrevista permitia-o. Mas se era Freitas que estava a ser entrevistado, era também muito natural que as suas respostas traduzissem o esforço e o desgaste pessoal a que se sente sujeito. Até porque a pergunta da jornalista, à qual se encontrava a responder, não se orientava para a classificação da agenda do MNE - para onde o prof. Vital Moreira desviou a questão - mas tão somente para o eventual cansaço provocado pelas viagens (que não passam de um aspecto particular da agenda do MNE). É que a pergunta foi mesmo muito clara: "As constantes viagens, o "jet lag", o avião, são cansativos para si?" Para si, sublinhe-se. Tem mesmo que se ler. Está lá.

3.
Quando na parte final da entrevista Freitas admite que era e não era importante estar na função no segundo semestre de 2007 recorrendo, além disso, ao tempo condicional para responder com um "posso dizer-lhe que não seria mais importante do que várias outras coisas que fiz na vida", que espécie de interpretações torna legítimas? Ou, mais directamente: porque não respondeu, por exemplo, com um "posso dizer-lhe que não será mais importante"?

4.
Apesar de tudo, admito que o título, lido a correr, possa dar a ideia (falsa, presume-se) de que Freitas está cansado de ser ministro dos negócios estrangeiros. Nesse caso bastaria uma breve nota à imprensa a explicar o exacto sentido da expressão em vez da desproporcionada conferência de imprensa que, pelos vistos, só foi cancelada devido à esclarecida intervenção de Sócrates. O que em nenhum caso parece haver razão é para se classificar o título do Expresso como "canalhice jornalística". Mas compreendo que a proximidade política com o Governo em funções não favoreça em nada a avaliação isenta de um dos seus mais emblemáticos ministros. Isso é natural
.