Excerto de um livro não anunciado (285)
Em "O Erro de Descartes" ele [António Damásio] dá-nos conta do importante trabalho de investigação que há duas décadas vem desenvolvendo no domínio da Neurociência, o que faz com invulgar clareza expositiva se atendermos ao rigor e à profundidade do seu pensamento. Um bom exemplo disso, é a descrição que nos dá do momento a partir do qual se convenceu que a perspectiva tradicional de encarar a racionalidade não poderia estar correcta. Essa perspectiva implicava, como se sabe, o reconhecimento de uma radical separação entre a razão e a emoção, no pressuposto de que a cada uma corresponderiam sistemas neurológicos autónomos. Daí que, ao nível do pensamento, a emoção fosse tida como fonte perturbadora de todo o raciocínio. Sempre que se pretendesse tomar uma decisão sensata, haveria, por isso, que fazê-lo de cabeça fria. Foi exactamente este modo de olhar a relação entre a razão e a emoção que António Damásio veio pôr em causa depois de ter observado que um dos seus doentes não conseguia resolver ou decidir adequadamente sobre pequenos e triviais problemas de cáracter prático, apesar da doença neurológica que, de um dia para o outro, o vitimara, não ter afectado a sua capacidade racional:
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