14 abril 2006

Excerto de um livro não anunciado (304)

Uma outra forma de situar a persuasão é a assumida por Murilo César Soares (*), para quem persuasão e sedução são apenas dois modos da retórica. A persuasão, derivando da argumentação e a sedução, proveniente da dramatização. Tem, sem dúvida, o mérito de reconhecer a presença de determinações estéticas e emotivas no discurso retórico, mas, ao pressupor que a persuasão deriva unicamente da argumentação (aqui, obviamente, subentendida como argumentação racional) permanece, ainda assim, refém de uma artificial separação entre razão e emoção que colide com a impossibilidade prática de se demarcarem fronteiras entre o que é persuasivo e o que é sedutor. E sem um critério de demarcação é a própria distinção que fica em causa. Mas a ideia de ver a persuasão e a sedução como modos da retórica, merece acolhimento como modelo hermenêutico de chegar a um entendimento menos divisionista da retórica, enquanto prática discursiva orientada para a produção de determinados efeitos. Já Meyer admite sem qualquer relutância que a sedução tem também o seu lugar na argumentação, ao dizer que “a relação retórica consagra uma distância social, psicológica, intelectual, que é constringente e de circunstância, que é estrutural porque, entre outras coisas, se manifesta por argumentos ou por sedução” (**).

(*) Murilo César Soares, "Retórica e Política", in Revista Comunicação & Política, Rio de Janeiro: Centro de Estudos Superiores Latino-Americanos, 1996, vol. III, nº. 2, nova série, Maio-Agosto.

(**) Michel Meyer, (1998), Questões de retórica: linguagem, razão e sedução, Lisboa: Edições 70, Ldª., p. 26