19 maio 2005

Excertos de um livro não anunciado (234)

E uma vez afastada a tentação dogmática, a crença numa hipotética verdade absoluta, é a relatividade que se assume como condição e possibilidade da própria argumentação. De facto, como lembra Oswaldo Porchat Pereira (*), a força de um argumento é sempre relativa. É relativa, em primeiro lugar, à maior ou menor competência de quem o utiliza. É relativa também aos interlocutores concretos que se visa persuadir. É ainda relativa às circunstâncias particulares em que o argumento tem lugar. Mas, além disso, a argumentação, no seu todo, é sempre relativa a uma visão do mundo mais ou menos comum aos interlocutores, onde se pode encontrar as premissas consensuais, a partir das quais se estrutura a própria discutibilidade. “Exorcizado o fantasma da verdade, valorizam-se o diálogo e o consenso intersubjectivo, mesmo se apenas prático, temporário, relativo. E a argumentação, por eles trabalhando, integra os discursos da subjectividade na trama da racionalidade intersubjectiva” (**).

(*) Pereira, O., Cepticismo e argumentação, in Carrilho, M. (org.), Retórica e comunicação, Porto: Edições ASA, 1994, p. 152
(**) Ibidem, p.154