05 janeiro 2006

Excerto de um livro não anunciado (278)

Uma outra razão que pode ter levado Perelman a cingir-se praticamente ao estudo da estrutura racional da argumentação, tem a ver com a sua confessada preferência pelo apelo à razão em desfavor do apelo à vontade. Essa preferência poderemos descortiná-la na forma como justifica a importância particular que no seu Tratado da argumentação irá conceder às argumentações filosóficas, as quais, no seu entender, são “tradicionalmente consideradas as mais ‘racionais’ possíveis, justamente por se presumir que se dirigem a leitores sobre os quais a sugestão, a pressão ou o interesse têm pouca ascendência” (*). Não admira por isso que, de quando em vez, nos fale de persuasão racional, no aparente propósito de esconjurar definitivamente toda e qualquer hipótese de actuação directa sobre a emoção do auditório. É o que podemos ver nas suas referências aos “ataques dos filósofos à teoria da persuasão racional desenvolvida nas obras de retórica” (**) ou quando, a propósito da oposição entre argumentação e violência, vem afirmar que “o uso da argumentação implica que se tenha renunciado a recorrer unicamente à força, que se dê apreço à adesão do interlocutor, obtida graças a uma persuasão racional...” (***).

(*) Chaim Perelman, (1999), Tratado da Argumentação, S. Paulo: Martins Fontes, p. 8
(**)
Ibidem, p. 51
(***)
Ibidem, p. 61