16 abril 2006

Excerto de um livro não anunciado (305)

Curiosamente, há também quem deixe a sedução fora quer da retórica quer da persuasão. É o que faz Bellenger, no seu livro La Persuasion (*), onde depois de proceder à distinção entre persuasão dissimulada e persuasão manifesta - ligando a primeira ao estratagema do ardil, da sugestão ou dominação e a segunda, tanto ao que chama de persuasão “sadia” como à retórica - remete a sedução para o campo da incitação meramente espontânea, com base no carisma, no encanto, no prestígio e na fascinação, fora, portanto, da prática intencional calculada, que é própria da persuasão em geral. Recorrendo a um processo de subdivisões sucessivas, Bellenger como que procede, além disso, a uma depuração de todas as “impurezas” da persuasão, as quais, segundo o seu ponto de vista, são mais próprias do estratagema e, imagine-se, da retórica: a arte do desvio, a inteligência ardilosa, a sugestão, a dominação e o mito do chefe, no caso do estratagema, e os sofismas, as figuras do discurso e o condicionamento psico-linguístico, no que à retórica diz respeito. Não surpreende, assim, que no seu afã discriminatório, acabe por classificar como racional a persuasão “sadia” e como emocional, a retórica. Deve dizer-se, no entanto, que a sua concepção de retórica não resistiria ao mínimo confronto com os desenvolvimentos teóricos mais recentes, especialmente a partir de Perelman, de que este trabalho procura dar conta. Daí que a sua classificação das diferentes formas de influência redunde numa sucessão de equívocos, que vão desde o rigoroso enclausurar da sugestão no estratagema até à suposta purificação da racionalidade persuasiva, uma vez desligada de toda a “irracionalidade” da retórica.

(*) Lionel Bellenger, (1996), La Persuasion, Paris: Presses Universitaires de France, p. 8