09 dezembro 2006

A moral e a guerra

Sim, Senhora Sócrates. Se as acções só pudessem ser julgadas por quem esteve nas mesmas situações, então teríamos de ter juizes, 'quase' assassinos, 'quase' ladrões, 'quase' violadores, tal como ‘quase’ santos ou ‘quase’ sábios. E isso é, logicamente, impraticável e absurdo. Mas o que aqui quis focar é que em nenhum caso o absurdo ou a mera impossibilidade de pôr em prática uma dada solução - presumivelmente a ideal ou mais justa - nos desobriga de reflectir sobre o imperativo ético-filosófico de garantir justiça a todos os cidadãos, em qualquer causa e circunstância, muito especialmente, diria, em situações verdadeiramente excepcionais, como o são todas as guerras.

O facto de, até ao momento, não ser possível julgar de outro modo, não significa que a situação seja justa. Assim como não me parece que a questão fique resolvida com o recurso a expressões e conceitos tão indeterminados como “limites”, “acção fundamentada” e “acção criminosa”. É que, seja o que for que estes signifiquem, terão sempre uma interpretação fora da guerra e outra dentro. Como muito bem disse a Carla Quevedo,
“Dificilmente podemos falar de moral quando há situações que não controlamos”.

A guerra é, por vezes, inevitável, e a justiça será sempre a dos homens, tributária da sua natural imperfeição. Mas é precisamente por um juiz não ser um "quase" assassino, um “quase” sábio nem, muitas vezes, um “quase” combatente, que tem de ter em conta que a mera representação mental de uma dada situação de guerra pode ficar a anos luz da vívida situação real em que os factos se produziram. É para esse drama do combatente* acusado que remete a afirmação final do capitão americano a qual, para ser falaciosa, precisaria de parecer verdadeira e ser falsa, o que não é o caso. Foi, provavelmente, apenas mais um desabafo de quem estava por dentro da guerra e a vivê-la, momento a momento. Mas um desabafo que "Dá que pensar", como escrevi logo no início do meu
post. Ou não dá?

* Combatente e não apenas militar.