24 dezembro 2007

Retórica religiosa: discutir o indiscutível?


Começou assim a excelente entrevista que o Pe. Anselmo Borges deu à Notícias Magazine do JN de 09 Dez 2007:

Quem é Deus?

Deus é o mistério último da realidade, e para os crentes das religiões monoteístas Deus é pai, é misericórdia e é o sentido último da existência, do mundo, da Histórias.

A ideia de Deus é sempre sinónimo de "ultimidade" (...). Que palavra definitiva. O que significa?

Quando dizemos "ultimidade" estamos a tentar dar resposta ao nosso perguntar sem limites. Trata-se da da realidade última, que nós não podemos captar. O fundamento último, e também o sentido último. Na nossa vida há sempre um momento em que nos perguntamos qual é o sentido de todos os sentidos, e aí estamos no domínio religioso"


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Não sei se quando nos perguntamos sobre qual é o sentido de todos os sentidos estaremos forçosamente no domínio religioso, mas essa é uma questão que pode esperar. Por agora oponho-me apenas à tão frequente racionalização do divino. Se Deus é o mistério último da existência - como o Pe Anselmo Borges reitera na sua entrevista à NM - que sentido terá responder à pergunta "Quem é Deus?". A palavra "mistério", segundo reza, por exemplo, aqui, significa uma "verdade dogmática da religião católica que é objecto de fé e que é impenetrável à razão humana" ou, mais claramente, ainda, "aquilo que é incompreensível, que não é explicável". De que vale então persistir em explicar o inexplicável, em fazer compreender o incompreensível ou discutir o que não tem discussão? É que do facto de se poder perguntar sem limites não se segue que se tenha de ter respostas para tudo. Tanto mais que quem o fizer se arrisca a deixar a ideia de que o sentimento religioso se confunde com ignorância, ou seja, com tudo aquilo que o homem ainda desconhece, o que é, como se sabe, rematadamente falso.