Sim, correu muito bem
Este é, provavelmente, o meu post mais extenso de sempre. Mas a pedido de várias famílias, vou hoje dar conta de como correu a apresentação do meu novo livro, na passada quinta-feira, no Auditório Municipal de Gondomar. Para facilitar a leitura, divido-o em três partes: (1) o programa, (2) o evento e (3) a apresentação.
1) O PROGRAMA
Foi o seguinte, o “programa das festas”:
*Apresentação: Paula Lima, jornalista de rádio.
*Guitarra clássica: Ricardo Carvalho, interpretação das peças “Vilanela” de Fernando Lopes Graça e “Fantasia” de Alonso Mudarra.
*Constituição da Mesa: Dr. Fernando Paulo - Vereador do Pelouro da Cultura da Câmara Municipal de Gondomar, Prof. Doutor Manuel Pinto - Apresentador-convidado e Américo de Sousa - Autor
*Ginástica acrobática: exibição do grupo de ginástica acrobática da Escola EB 2,3 de Fânzeres, sob orientação da Prof.ª Carla Araújo
*Apresentação do livro: Prof. Doutor Manuel Pinto - Docente e investigador na Universidade do Minho e actual Provedor dos Leitores do Jornal de Notícias
*Debate
*Coreografias: exibição do grupo de coreografias da Escola EB 2,3 de Fânzeres, sob orientação das Prof.ªs Ana Paula Sousa, Cláudia Brito e Lídia Neves.
*Porto D’Honra / Autógrafos
2) O EVENTO
Notas soltas:
Estiveram presentes cerca de 250 pessoas.
A actuação do guitarrista Ricardo Carvalho e dos grupos de ginástica acrobática e coreografias da escola Eb 2,3 de Fânzeres, “caiu” muito bem no auditório que não lhes regateou aplausos, ao mesmo tempo que revestiu o evento de apropriada tonalidade artístico-cultural.
A apresentação da obra, feita pelo Prof. Doutor Manuel Pinto, prendeu a atenção de todos, pela sua clareza e profundidade, e também pelo modo como soube transmitir aos presentes a sua muito cuidada e certeira interpretação do livro.
Durante o debate, o autor aproveitou para esclarecer as principais motivações que o levaram a eleger os desafios éticos do futuro tecnológico como tema central da sua investigação, após o que fez um agradecimento especial ao Dr. Fernando Paulo, responsável pelo Pelouro da Cultura da Câmara de Gondomar e à Dr.ª Susana Sistelo, Presidente do Conselho Executivo da Escola EB 2,3 de Fânzeres, pelo apoio logístico e cultural com que o distinguiram.
No final foi servido um Porto D’Honra por elementos do Rancho Folclórico da Portelinha de Fânzeres que, trajados a rigor, deram ainda mais colorido ao convívio, nomeadamente, entre aqueles que se encontravam na fila para os autógrafos.
Foi isso. Correu muito bem. Obrigado a todos.
3) A APRESENTAÇÃO
E agora, só para os mais curiosos, deixo aqui algumas das palavras proferidas pelo Prof. Manuel Pinto durante a apresentação do livro que titulou como:
Usos e abusos do talento humano na era tecnológica
Vivemos tempos tão desafiadores, inquietantes e, de um certo ponto de vista, tão alucinantes que só podemos agradecer a quem nos convida a deixar à porta as certezas e a aceitar reflectir sobre o mundo em que queremos viver e que pretendemos deixar aos nossos vindouros. É o caso do autor deste interessante livro “O homem com medo de si próprio”. Um título chamativo (ao qual regressarei mais adiante), com um subtítulo que aponta a matéria a tratar: o cada vez mais complexo jogo entre a ética e a técnica ou, mais propriamente, a tecnologia. Um livro, diga-se, bem apresentado, bem costurado, de singela capa, bela na sua simplicidade e poder comunicativo. (...) À medida que [o] lia (...) também me dei conta, como o leitor decerto comprovará, de que os assuntos tratados tocam no mais íntimo de nós, como indivíduos e como espécie humana. Porque são questões que têm que ver com confiança e claudicação, medo e coragem, acção e paralisia, e, em última instância, com questões de vida e de morte. Nada menos: de vida e de morte.
***
Mas de que trata, afinal, o livro que hoje aqui nos trouxe? De uma forma simplista, “O homem com medo de si próprio” trata do mundo que a tecnologia está a produzir diante dos nossos olhos, sem que, frequentemente, nós nos apercebamos para onde é que esta barca se encaminha, em águas tão agitadas(...) quando nos chegam notícias sobre armas de destruição maciça, sobre clonagem de embriões humanos, sobre implantes de chips no cérebro de pessoas, de modo a poder manipulá-las, começam a soar as campainhas da inquietação e do medo. E a emergir no espaço público aquelas perguntas que muitos não querem que se faça, porque as não querem ouvir: aquilo que se pode fazer, deve-se fazer? (...) Mais: em que medida poderemos continuar a falar da pessoa humana, com a sua identidade, a sua autonomia e a sua cidadania, tal como hoje a concebemos, quando o ente que se pode estar a desenhar é já “outra coisa”, produto de implantes, de próteses ou de transplantes, ou um híbrido pessoa-máquina? É disto que trata o livro que aqui nos reúne esta noite. Não se está a falar apenas de cenários futuristas e utópicos, desenhados ou sonhados por loucos. Não. É de problemas próximos de nós (...)
***
(...) pesando as vantagens da pesquisa científica e tecnológica de ponta e os riscos que ela pode comportar, será legítimo ou mesmo razoável que se suspenda o progresso? Que se renuncie à inovação, por causa do risco? A que critérios deitar mão, para discernir, no meio de tão magna encruzilhada? Poderão os referenciais éticos que fundam as nossas sociedades aguentar intocados perante desafios tão surpreendentes? (...) O ensaio das respostas é o tema desta obra. Não deverei desvendar a argumentação do autor, para que possam fazer, como eu, a experiência, a um tempo intelectual e emocional, da apresentação do tema, dos problemas e reptos nele contidos, dos argumentos aduzidos para os analisar e das conclusões a que é possível chegar. É assim também uma sinfonia musical. Ou uma narrativa. E este livro pode ser lido como uma narrativa de segunda instância sobre os horizontes das sociedades contemporâneas. Ela fala-nos do fosso entre o poder de agir e o poder de prever e de ajuizar (p.50). Fala-nos da humildade, da cautela, de uma nova sabedoria para lidar com o imprevisível, com a abertura de novos cenários para a qualidade da vida humana e social (...)
***
“O homem com medo de si próprio” seria, por conseguinte, não o homem – e a mulher – encurralados, petrificados, impotentes, mas, antes, perspicazes, inquietos, insubmissos, prudentes, capazes da “ponderação dos benefícios que se esperam e dos riscos inerentes à sua obtenção”. Uma dúvida que tenho, e que poderia ser uma achega à reflexão de Américo de Sousa, refere-se às incidências da lógica de pendor produtivista, de eficácia, de competitividade e mesmo de feroz competição, que marca estruturalmente as nossas economias e contagia cada vez mais áreas que se mantinham relativamente à margem desse clima. Em que medida a dinâmica interna desta “ordem do mercado”, digamos assim, não tornará imparável a corrida para ver quem chega primeiro ao reino do desconhecido, ou, se quisermos, ao reino dos aprendizes de feiticeiro?
***
(...) em que medida poderemos continuar a alimentar uma concepção de ciência que remete para segundo plano, quando não ignora ostensivamente, o lugar das ciências sociais e humanas, no que elas têm de específico e quiçá decisivo a dar, na compreensão das circunstâncias subjectivas, contextuais, históricas e culturais dos novos inventos e cenários tecnológicos? (...) O paradoxo reside precisamente aí: queixamo-nos dos riscos de as máquinas tomarem a dianteira às pessoas (p.99), mas organizamos as coisas de tal modo que é precisamente isso que pode estar a acontecer. Evoco, neste contexto, a imagem do “poço da morte” das nossas feiras e festas populares. A pessoa que velozmente circula em espiral na parte de dentro do poço tem de ser capaz de encontrar o ponto justo da velocidade, de modo a não andar tão depressa que saia disparado pela boca superior, nem tão devagar que perca a aderência e se esmague no fundo. O que dá a noção do ponto justo a este nosso piloto é, em alguma medida, o mesmo de que precisa a tecnociência para não se perder de forma irremediável (...)
***
Como a acção, para ser eficaz, carece de sentido e argumentos, torna-se vital fazer da ciência e da técnica matéria de debate público: os rumos, os projectos e os ritmos da investigação científica e tecnológica são demasiado importantes para serem assumidos, nas suas potencialidades e nos seus riscos, apenas pelos especialistas (p.62). O livro apresenta-se precisamente como uma espécie de mapeamento de alguns dos pontos centrais que devem ser submetidos à discussão (p.99). É aí que está o seu interesse e o seu alcance. De resto, é-me grato sublinhar o tom afirmativo e esperançoso que o autor dá à sua obra. Escreve, no remate final: “Acreditamos no homem. Bem certo que mais nas capacidades do que nas acções, mais na ciência do que na aplicação do saber. Mas acreditamos. Não só porque o passado nos oferece boas razões para acreditar, mas também porque, no desafio da vida, não acreditar seria o mesmo que entrar em campo já a perder”. Ou ainda, nas palavras do autor, “todos somos responsáveis, tanto na hora de semear como na altura de colher”. Eu não saberia dizer melhor.
Manuel Pinto
1) O PROGRAMA
Foi o seguinte, o “programa das festas”:
*Apresentação: Paula Lima, jornalista de rádio.
*Guitarra clássica: Ricardo Carvalho, interpretação das peças “Vilanela” de Fernando Lopes Graça e “Fantasia” de Alonso Mudarra.
*Constituição da Mesa: Dr. Fernando Paulo - Vereador do Pelouro da Cultura da Câmara Municipal de Gondomar, Prof. Doutor Manuel Pinto - Apresentador-convidado e Américo de Sousa - Autor
*Ginástica acrobática: exibição do grupo de ginástica acrobática da Escola EB 2,3 de Fânzeres, sob orientação da Prof.ª Carla Araújo
*Apresentação do livro: Prof. Doutor Manuel Pinto - Docente e investigador na Universidade do Minho e actual Provedor dos Leitores do Jornal de Notícias
*Debate
*Coreografias: exibição do grupo de coreografias da Escola EB 2,3 de Fânzeres, sob orientação das Prof.ªs Ana Paula Sousa, Cláudia Brito e Lídia Neves.
*Porto D’Honra / Autógrafos
2) O EVENTO
Notas soltas:
Estiveram presentes cerca de 250 pessoas.
A actuação do guitarrista Ricardo Carvalho e dos grupos de ginástica acrobática e coreografias da escola Eb 2,3 de Fânzeres, “caiu” muito bem no auditório que não lhes regateou aplausos, ao mesmo tempo que revestiu o evento de apropriada tonalidade artístico-cultural.
A apresentação da obra, feita pelo Prof. Doutor Manuel Pinto, prendeu a atenção de todos, pela sua clareza e profundidade, e também pelo modo como soube transmitir aos presentes a sua muito cuidada e certeira interpretação do livro.
Durante o debate, o autor aproveitou para esclarecer as principais motivações que o levaram a eleger os desafios éticos do futuro tecnológico como tema central da sua investigação, após o que fez um agradecimento especial ao Dr. Fernando Paulo, responsável pelo Pelouro da Cultura da Câmara de Gondomar e à Dr.ª Susana Sistelo, Presidente do Conselho Executivo da Escola EB 2,3 de Fânzeres, pelo apoio logístico e cultural com que o distinguiram.
No final foi servido um Porto D’Honra por elementos do Rancho Folclórico da Portelinha de Fânzeres que, trajados a rigor, deram ainda mais colorido ao convívio, nomeadamente, entre aqueles que se encontravam na fila para os autógrafos.
Foi isso. Correu muito bem. Obrigado a todos.
3) A APRESENTAÇÃO
E agora, só para os mais curiosos, deixo aqui algumas das palavras proferidas pelo Prof. Manuel Pinto durante a apresentação do livro que titulou como:
Usos e abusos do talento humano na era tecnológica
Vivemos tempos tão desafiadores, inquietantes e, de um certo ponto de vista, tão alucinantes que só podemos agradecer a quem nos convida a deixar à porta as certezas e a aceitar reflectir sobre o mundo em que queremos viver e que pretendemos deixar aos nossos vindouros. É o caso do autor deste interessante livro “O homem com medo de si próprio”. Um título chamativo (ao qual regressarei mais adiante), com um subtítulo que aponta a matéria a tratar: o cada vez mais complexo jogo entre a ética e a técnica ou, mais propriamente, a tecnologia. Um livro, diga-se, bem apresentado, bem costurado, de singela capa, bela na sua simplicidade e poder comunicativo. (...) À medida que [o] lia (...) também me dei conta, como o leitor decerto comprovará, de que os assuntos tratados tocam no mais íntimo de nós, como indivíduos e como espécie humana. Porque são questões que têm que ver com confiança e claudicação, medo e coragem, acção e paralisia, e, em última instância, com questões de vida e de morte. Nada menos: de vida e de morte.
***
Mas de que trata, afinal, o livro que hoje aqui nos trouxe? De uma forma simplista, “O homem com medo de si próprio” trata do mundo que a tecnologia está a produzir diante dos nossos olhos, sem que, frequentemente, nós nos apercebamos para onde é que esta barca se encaminha, em águas tão agitadas(...) quando nos chegam notícias sobre armas de destruição maciça, sobre clonagem de embriões humanos, sobre implantes de chips no cérebro de pessoas, de modo a poder manipulá-las, começam a soar as campainhas da inquietação e do medo. E a emergir no espaço público aquelas perguntas que muitos não querem que se faça, porque as não querem ouvir: aquilo que se pode fazer, deve-se fazer? (...) Mais: em que medida poderemos continuar a falar da pessoa humana, com a sua identidade, a sua autonomia e a sua cidadania, tal como hoje a concebemos, quando o ente que se pode estar a desenhar é já “outra coisa”, produto de implantes, de próteses ou de transplantes, ou um híbrido pessoa-máquina? É disto que trata o livro que aqui nos reúne esta noite. Não se está a falar apenas de cenários futuristas e utópicos, desenhados ou sonhados por loucos. Não. É de problemas próximos de nós (...)
***
(...) pesando as vantagens da pesquisa científica e tecnológica de ponta e os riscos que ela pode comportar, será legítimo ou mesmo razoável que se suspenda o progresso? Que se renuncie à inovação, por causa do risco? A que critérios deitar mão, para discernir, no meio de tão magna encruzilhada? Poderão os referenciais éticos que fundam as nossas sociedades aguentar intocados perante desafios tão surpreendentes? (...) O ensaio das respostas é o tema desta obra. Não deverei desvendar a argumentação do autor, para que possam fazer, como eu, a experiência, a um tempo intelectual e emocional, da apresentação do tema, dos problemas e reptos nele contidos, dos argumentos aduzidos para os analisar e das conclusões a que é possível chegar. É assim também uma sinfonia musical. Ou uma narrativa. E este livro pode ser lido como uma narrativa de segunda instância sobre os horizontes das sociedades contemporâneas. Ela fala-nos do fosso entre o poder de agir e o poder de prever e de ajuizar (p.50). Fala-nos da humildade, da cautela, de uma nova sabedoria para lidar com o imprevisível, com a abertura de novos cenários para a qualidade da vida humana e social (...)
***
“O homem com medo de si próprio” seria, por conseguinte, não o homem – e a mulher – encurralados, petrificados, impotentes, mas, antes, perspicazes, inquietos, insubmissos, prudentes, capazes da “ponderação dos benefícios que se esperam e dos riscos inerentes à sua obtenção”. Uma dúvida que tenho, e que poderia ser uma achega à reflexão de Américo de Sousa, refere-se às incidências da lógica de pendor produtivista, de eficácia, de competitividade e mesmo de feroz competição, que marca estruturalmente as nossas economias e contagia cada vez mais áreas que se mantinham relativamente à margem desse clima. Em que medida a dinâmica interna desta “ordem do mercado”, digamos assim, não tornará imparável a corrida para ver quem chega primeiro ao reino do desconhecido, ou, se quisermos, ao reino dos aprendizes de feiticeiro?
***
(...) em que medida poderemos continuar a alimentar uma concepção de ciência que remete para segundo plano, quando não ignora ostensivamente, o lugar das ciências sociais e humanas, no que elas têm de específico e quiçá decisivo a dar, na compreensão das circunstâncias subjectivas, contextuais, históricas e culturais dos novos inventos e cenários tecnológicos? (...) O paradoxo reside precisamente aí: queixamo-nos dos riscos de as máquinas tomarem a dianteira às pessoas (p.99), mas organizamos as coisas de tal modo que é precisamente isso que pode estar a acontecer. Evoco, neste contexto, a imagem do “poço da morte” das nossas feiras e festas populares. A pessoa que velozmente circula em espiral na parte de dentro do poço tem de ser capaz de encontrar o ponto justo da velocidade, de modo a não andar tão depressa que saia disparado pela boca superior, nem tão devagar que perca a aderência e se esmague no fundo. O que dá a noção do ponto justo a este nosso piloto é, em alguma medida, o mesmo de que precisa a tecnociência para não se perder de forma irremediável (...)
***
Como a acção, para ser eficaz, carece de sentido e argumentos, torna-se vital fazer da ciência e da técnica matéria de debate público: os rumos, os projectos e os ritmos da investigação científica e tecnológica são demasiado importantes para serem assumidos, nas suas potencialidades e nos seus riscos, apenas pelos especialistas (p.62). O livro apresenta-se precisamente como uma espécie de mapeamento de alguns dos pontos centrais que devem ser submetidos à discussão (p.99). É aí que está o seu interesse e o seu alcance. De resto, é-me grato sublinhar o tom afirmativo e esperançoso que o autor dá à sua obra. Escreve, no remate final: “Acreditamos no homem. Bem certo que mais nas capacidades do que nas acções, mais na ciência do que na aplicação do saber. Mas acreditamos. Não só porque o passado nos oferece boas razões para acreditar, mas também porque, no desafio da vida, não acreditar seria o mesmo que entrar em campo já a perder”. Ou ainda, nas palavras do autor, “todos somos responsáveis, tanto na hora de semear como na altura de colher”. Eu não saberia dizer melhor.
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