29 maio 2005

Faltar à palavra

Sócrates anunciou em plena campanha eleitoral (mas também já depois das eleições) que não mexeria nos impostos. Chegado ao Governo, foi a primeira coisa que fez: aumentou-os. Depois, em jeito de esfarrapada desculpa, veio dizer-nos que ignorava a real dimensão do défice. Não surpreende, por isso que, ainda que indirectamente, António Barreto o acuse, no Público de hoje, de incompetente ou mentiroso e haja até quem o considere uma e outra coisa.

O Rui, do Blasfémias, porém, parece ter outra explicação para o socrático zig-zag:

"Eu sei que o Engº Sócrates prometeu em campanha eleitoral que um governo liderado por si não aumentaria os impostos. Mas também sei que ninguém acreditou verdadeiramente nisso."

Bom... se ninguém acreditou no que Sócrates prometeu (hipótese meramente académica), é porque logo se viu que era mentira. E se era mentira, não deixou de sê-lo só porque a vítima não se deixou enganar. Não é esta, no entanto, a opinião do Rui que retoma a defesa do nosso primeiro com este surpreendente argumento:

"Os socialistas são verdadeiramente defensores do Estado Social, que criaram e querem preservar a todo o custo. Nesse aspecto, diga-se em abono da verdade que Sócrates nunca mentiu: ele é socialista e defende o modelo social (...)"

Isso mesmo, sem tirar nem pôr: "Sócrates nunca mentiu: ele é socialista e defende o modelo social(...)". Como diria um amigo meu, não vale assobiar para o ar. Quer o Rui fazer-nos crer que quem defende um "modelo social" se pode dar ao luxo de faltar à palavra sem que por isso seja eticamente responsabilizado? E já agora: será preciso recordar-lhe que se Sócrates mentiu foi por prometer não aumentar os impostos e não por se afirmar socialista ou defensor do modelo social?

(*) Post "ESPANTADOS? COM QUÊ?", de 25.05.2005