A magia do gato
Para Arnold Gehlen (*) o homem de todas as culturas primitivas e de todas as altas culturas como a egípcia, a grega e a romana, sempre esteve preso a uma espécie de técnica sobrenatural (a que hoje chamamos magia). E face às práticas mágicas perfeitamente estereotipadas que continuam a ter lugar, independentemente de raças e de graus de cultura, é ainda Gehlen quem considera que a extraordinária expansão da magia em todo o mundo e a sua persistência em todas as épocas só pode radicar em algo de antropologicamente fundamental. É bem provável que sim, que a magia seja constitutiva do humano e que a razão, desse modo, nem tudo possa explicar. Por entre as apertadas malhas da razão logico-discursiva com que mais rigorosamente partilhamos ideias e conceitos, interpor-se-á então uma não menos racional comunicação de sentimentos e emoções, quer a pessoas, quer a animais.
É aqui que entram os adorados gatos do Paulo Cunha Porto e a simpática interpelação que me faz. Porque na ausência de um código partilhado, creio que a comunicação com um animal tem menos de retórica e mais de magia (a qual não carece de explicação). Até admito que o «O gato, efectivamente, não se deixa dominar, deixa-se apenas Persuadir. Quem o souber persuadir, obtém dele o que quiser». Não sou tão próximo dos gatos como se revela o Paulo e posso até adiantar que, para mim, as mulheres têm estado e estarão sempre em primeiro. Mas convém recordar que se toda a retórica é persuasão nem toda a persuasão é retórica. Só é verdadeiramente retórica uma comunicação que se estruture na tríade "ethos-logos-pathos" o que não é o caso da comunicação com um animal onde, quando muito, intervém apenas um mitigado pathos. Por outro lado, na impossibilidade da troca das palavras, pode-se realmente falar numa retórica dos gestos. Mas numa retórica dos gestos (tal como, mais generalizadamente, numa retórica de imagens), os gestos (ou as imagens) terão que oferecer aos seus destinatários um determinado "espaço interpretativo" (**) que forçosamente remete para o Logos. E com franqueza, não vejo que um gato tenha arcaboiço para tanto. Mas posso estar errado. Nada como aguardar o douto esclarecimento do caríssimo PCP.
(*) Cf. cit. in Américo de Sousa, (2004), O Homem Com Medo de Si Próprio, Porto: Estratégias Criativas, p. 19
(**) Cf. Vilém Flusser, (1998), Ensaio sobre a Fotografia, Para uma Filosofia da Técnica, Lisboa: Relógio D'Água, p. 28
É aqui que entram os adorados gatos do Paulo Cunha Porto e a simpática interpelação que me faz. Porque na ausência de um código partilhado, creio que a comunicação com um animal tem menos de retórica e mais de magia (a qual não carece de explicação). Até admito que o «O gato, efectivamente, não se deixa dominar, deixa-se apenas Persuadir. Quem o souber persuadir, obtém dele o que quiser». Não sou tão próximo dos gatos como se revela o Paulo e posso até adiantar que, para mim, as mulheres têm estado e estarão sempre em primeiro. Mas convém recordar que se toda a retórica é persuasão nem toda a persuasão é retórica. Só é verdadeiramente retórica uma comunicação que se estruture na tríade "ethos-logos-pathos" o que não é o caso da comunicação com um animal onde, quando muito, intervém apenas um mitigado pathos. Por outro lado, na impossibilidade da troca das palavras, pode-se realmente falar numa retórica dos gestos. Mas numa retórica dos gestos (tal como, mais generalizadamente, numa retórica de imagens), os gestos (ou as imagens) terão que oferecer aos seus destinatários um determinado "espaço interpretativo" (**) que forçosamente remete para o Logos. E com franqueza, não vejo que um gato tenha arcaboiço para tanto. Mas posso estar errado. Nada como aguardar o douto esclarecimento do caríssimo PCP.
(*) Cf. cit. in Américo de Sousa, (2004), O Homem Com Medo de Si Próprio, Porto: Estratégias Criativas, p. 19
(**) Cf. Vilém Flusser, (1998), Ensaio sobre a Fotografia, Para uma Filosofia da Técnica, Lisboa: Relógio D'Água, p. 28
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