23 novembro 2005

Excerto de um livro não anunciado (267)

Mendacium est enunciatio cum voluntate falsum enuntiandi – assim definia Santo Agostinho a mentira. E, de facto, mentir é dizer o falso com a intenção de enganar. Mas a aparente simplicidade desta expressão poderia levar-nos a descurar a problematicidade que a encerra, nomeadamente quanto ao que se deve entender por falso e por intenção de enganar. Assim, dizer o falso não significa tão somente dizer o contrário do verdadeiro. No que à mentira concerne, dizer falso integra igualmente o dizer o diferente e até, dizer o que nem é falso nem verdadeiro. Por outro lado, limitar o discurso da mentira àquele em que o respectivo autor tem a intenção de enganar o ouvinte, pressupõe, desde logo, a exclusão do discurso meramente equivocado, ou seja, aquele em que o orador diz, sinceramente, algo de errado, que, no entanto, tem como certo. Quando o sujeito que fala está convencido de que diz a verdade, ele não mente, apenas erra.