Retórica e Ensaísmo (2)
Carlos Scolari, do digitalismo.com, teve a gentileza de responder aqui, ao meu post Retórica e Ensaísmo (13 Set). Lisonjeado, cumpre-me aditar o seguinte:
1) Como o próprio título do post deixava claro, a minha principal intenção era a de comentar a relação entre retórica e ensaísmo e não tanto, a de comparar “ensaio” com “actividade empírica” (seja lá o que isso for).
2) Aliás, esta última comparação, nos termos em que surgiu, faz muito pouco sentido, desde logo, porque o “ensaio” tem a ver com a apresentação dos resultados da investigação que forçosamente o antecede(u) – é um dizer – enquanto a “actividade empírica” se traduz na investigação propriamente dita – é um fazer.
3) Acresce que o ensaísta não tem que fatalmente prescindir de um “trabalho de campo” mas, sempre que tal aconteça, a ideia prévia de que opta por um registo de pura ficção, por “golpes de literatura o especulaciones” não tem a menor consistência teórica.
4) O ensaio pode ser literário, filosófico ou cientifico, mas em qualquer caso, o seu autor deverá sempre escolher a metodologia de investigação e a estratégia expositiva mais adequadas ao objecto de estudo e às condições em que o mesmo se desenvolve(u).
5) Uns objectos de estudo (e concretas condições de investigação) prestam-se mais à metodologia empírica, outros mais à reflexão, à formulação crítica e hipotética, daí não decorrendo, por si só, qualquer reforço ou quebra do respectivo estatuto científico.
6) Em todo o caso, chegado o momento do investigador apresentar os resultados aos seus pares ou, quando se justifique, também ao público em geral, mais do que intitular o respectivo texto de ensaio, paper ou artigo científico, interessa é que seja claro e argumentativamente convincente na identificação do problema, na metódica exposição do estudo realizado, na formulação de hipóteses, na apresentação das conclusões. E isso, como sabemos, depende bem mais do investigador do que do género narrativo escolhido.
7) Refiro-me ao ensaio, mais do que ao ensaísmo, só porque este último recebe muitas vezes uma conotação irónica e depreciativa que aqui não tem lugar, tanto mais que o “ísmo” do ensaísmo, não é mais “ísmo” do que qualquer outro, a começar pelo “ísmo” do empirismo.
8) Concretizando agora a minha afirmação inicial (ponto 1), esclareço que o preconceito a que me quis referir não tem a ver com o “planteo” de Carlos Scolari mas, mais exactamente, com a ideia de Roberto Follari (citado por Carlos) de que a “literaturización de las ciencias sociales” se caracteriza pela “proliferación generalizada de la retórica por sobre el análisis empírico”, o que deixa no ar uma ultrapassada, errada e inadmissível concepção de retórica. Tão só.
9) Classificar, porém, o ensaio científico como meros “golpes de literatura o especulaciones” - independentemente dos métodos de investigação em que o dito se apoia e do rigor argumentativo que o caracterize - pode até despertar a simpatia que em geral se tem pelas ideias feitas (ex: a retórica não passa de um discurso estéril e encantatório) mas indicia igualmente uma visão tão reducionista de ciência que põe em causa a própria epistemologia da comunicação.
10) Outra coisa é saber se será mais vantajoso para o progresso global do campo científico da comunicação, aumentar a percentagem de “trabalhos de campo”. Ou se estes serão sempre a melhor forma de investigação para a compreensão científica de todos os aspectos da comunicação. Poderíamos interrogarmo-nos também se os estudos de comunicação são a continuação da filosofia por outros meios (como pergunta o Carlos) ou se tais estudos são antes a continuação da matemática, da física, da biologia, da engenharia ou da sociologia por outros meios (como poderia perguntar eu). Podemos, finalmente, perguntar ambos se o "ensaio" está necessariamente correlacionado com a "má" investigação e o "trabalho de campo" com a "boa" investigação. Como se vê, questões não nos faltam. O que nos falta, por vezes, é resistir ao afunilamento epistemológico nesta ou naquela área de conhecimento, desta ou daquela metodologia.
1) Como o próprio título do post deixava claro, a minha principal intenção era a de comentar a relação entre retórica e ensaísmo e não tanto, a de comparar “ensaio” com “actividade empírica” (seja lá o que isso for).
2) Aliás, esta última comparação, nos termos em que surgiu, faz muito pouco sentido, desde logo, porque o “ensaio” tem a ver com a apresentação dos resultados da investigação que forçosamente o antecede(u) – é um dizer – enquanto a “actividade empírica” se traduz na investigação propriamente dita – é um fazer.
3) Acresce que o ensaísta não tem que fatalmente prescindir de um “trabalho de campo” mas, sempre que tal aconteça, a ideia prévia de que opta por um registo de pura ficção, por “golpes de literatura o especulaciones” não tem a menor consistência teórica.
4) O ensaio pode ser literário, filosófico ou cientifico, mas em qualquer caso, o seu autor deverá sempre escolher a metodologia de investigação e a estratégia expositiva mais adequadas ao objecto de estudo e às condições em que o mesmo se desenvolve(u).
5) Uns objectos de estudo (e concretas condições de investigação) prestam-se mais à metodologia empírica, outros mais à reflexão, à formulação crítica e hipotética, daí não decorrendo, por si só, qualquer reforço ou quebra do respectivo estatuto científico.
6) Em todo o caso, chegado o momento do investigador apresentar os resultados aos seus pares ou, quando se justifique, também ao público em geral, mais do que intitular o respectivo texto de ensaio, paper ou artigo científico, interessa é que seja claro e argumentativamente convincente na identificação do problema, na metódica exposição do estudo realizado, na formulação de hipóteses, na apresentação das conclusões. E isso, como sabemos, depende bem mais do investigador do que do género narrativo escolhido.
7) Refiro-me ao ensaio, mais do que ao ensaísmo, só porque este último recebe muitas vezes uma conotação irónica e depreciativa que aqui não tem lugar, tanto mais que o “ísmo” do ensaísmo, não é mais “ísmo” do que qualquer outro, a começar pelo “ísmo” do empirismo.
8) Concretizando agora a minha afirmação inicial (ponto 1), esclareço que o preconceito a que me quis referir não tem a ver com o “planteo” de Carlos Scolari mas, mais exactamente, com a ideia de Roberto Follari (citado por Carlos) de que a “literaturización de las ciencias sociales” se caracteriza pela “proliferación generalizada de la retórica por sobre el análisis empírico”, o que deixa no ar uma ultrapassada, errada e inadmissível concepção de retórica. Tão só.
9) Classificar, porém, o ensaio científico como meros “golpes de literatura o especulaciones” - independentemente dos métodos de investigação em que o dito se apoia e do rigor argumentativo que o caracterize - pode até despertar a simpatia que em geral se tem pelas ideias feitas (ex: a retórica não passa de um discurso estéril e encantatório) mas indicia igualmente uma visão tão reducionista de ciência que põe em causa a própria epistemologia da comunicação.
10) Outra coisa é saber se será mais vantajoso para o progresso global do campo científico da comunicação, aumentar a percentagem de “trabalhos de campo”. Ou se estes serão sempre a melhor forma de investigação para a compreensão científica de todos os aspectos da comunicação. Poderíamos interrogarmo-nos também se os estudos de comunicação são a continuação da filosofia por outros meios (como pergunta o Carlos) ou se tais estudos são antes a continuação da matemática, da física, da biologia, da engenharia ou da sociologia por outros meios (como poderia perguntar eu). Podemos, finalmente, perguntar ambos se o "ensaio" está necessariamente correlacionado com a "má" investigação e o "trabalho de campo" com a "boa" investigação. Como se vê, questões não nos faltam. O que nos falta, por vezes, é resistir ao afunilamento epistemológico nesta ou naquela área de conhecimento, desta ou daquela metodologia.
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