09 maio 2005

Excertos de um livro não anunciado (232)

Mas quais são e em que consistem esses três grandes níveis de articulações interrogativas? Para Meyer são a factualização, a qualificação e a legitimação. A factualização que incide sobre o “que”, ou seja, quando está em questão se este ou aquele facto se produziu. Quanto à qualificação esta actua sobre o “o que”, onde já não está em causa se o facto se verificou ou não (por já se encontrar admitido) mas sim a sua caracterização, como por exemplo, quando encontramos uma pessoa inanimada e nos interrogamos se terá sido devido a doença, acidente ou crime. Por último, a legitimação - que pode ser considerada como um meta-nível na medida em que se trata da questão de legitimidade – onde o que está em causa é a “legitimidade daquele que fala, do seu direito a interrogar-nos, das razões que pode ou não invocar, das normas argumentativas que também reconheceremos como válidas entre nós, de facto ou de comum acordo expresso” (*). A cada uma destas três grandes articulações interrogativas Meyer associa ainda uma diferente concepção de argumentação. Assim, no primeiro tipo de interrogação teremos a argumentação como dialéctica, em que se procura saber se uma proposição é verdadeira ou se um facto ou acontecimento se produziu ou não. No segundo tipo de interrogação surge a argumentação como “retórica do sentido, das figuras, da interpretação do sentido e já não do debate contraditório” (**). O terceiro tipo de interrogação é aquele em que o objecto do debate já não é o sentido mas sim a identidade e a diferença entre os seres que, ao comunicarem o que os identifica, deixam também mais nítido tudo o que os separa.

(*) Meyer, M., (1998), Questões de retórica: linguagem, razão e sedução, Lisboa: Edições 70, Lda., p. 45
(**) Meyer, M., As bases da retórica, in Carrilho, M. (org.), (1994), Retórica e Comunicação, Porto: Edições ASA, p. 63