11 fevereiro 2006

Tanto melhor para o país

"A política financeira, a que o país já se tinha resignado, que a direita apoiou e que os peritos maciçamente aprovaram, não provocou protestos de maior. A derrota nas locais foi escondida pela campanha para as presidenciais. Mesmo a derrota de Soares, que em princípio o poderia abalar, acabou por ser vista como uma derrota pessoal de Soares perante Alegre e não como a derrota do candidato do PS perante Cavaco. Na imprensa e na televisão, pouca gente se interessou pelo papel de Sócrates no episódio e quase toda a gente correu atrás de Alegre, para ver (inutilmente) se daquela cabeça saía alguma ideia. Quando esse arraial esmoreceu, veio por milagre o caso das caricaturas, que afastou outra vez Sócrates para a obscuridade. E, no fundo, até a OPA do eng. Belmiro ajudou. Há meses que o Governo governa clandestinamente. Sempre fora do "ciclo de notícias", parece invisível."

Vasco Pulido Valente, Público, 11 Fevereiro 2006.

1.

Estou em crer que este pedaço da crónica de VPV, com excepção da referência pouco simpática a Manuel Alegre e da metafórica clandestinidade para que remete o Governo, será suficientemente objectivo e realista para despertar o assentimento geral. O Governo tem, de facto, trabalhado em paz, sem a pressão crítica a que uma maior visibilidade o exporia, e isso, como assinala VPV, fica a dever-se, em grande parte, a uma série de acontecimentos de elevado potencial distractivo, como aqueles a que o cronista alude.

2.
Sorte de Sócrates? Concerteza. Mas, em grande medida, sorte também para o país, que o mesmo é dizer, sorte para todos nós. Porque este Governo, qualquer Governo, precisa de tempo e serenidade para atacar os graves problemas que tem pela frente. É preciso, por isso, evitar que os nossos governantes gastem mais tempo a prestar esclarecimentos e a responder a questões sobre o modo como governam, do que a governar efectivamente.

3.
A vigilância crítica dos cidadãos é indispensável. O controlo e a fiscalização política por parte da oposição e dos Media, idem aspas. Mas não deve o exercício de tais direitos degenerar, em caso algum, num mero expediente para desgastar a imagem do Governo, para o atafulhar de acusações e pedidos de esclarecimento, para lhe barrar o caminho, para o desestabilizar, numa palavra, para artificialmente lhe criar ainda mais dificuldades do que as que já tem, para cumprir o seu programa de governação.

4.
Daí que se o actual Governo está a viver um segundo "estado de graça" que lhe permite concentrar-se mais na acção governativa propriamente dita e, consequentemente, aumentar o seu rácio de sucesso, tanto melhor para ele, claro, mas principalmente, tanto melhor para o país.