04 janeiro 2008

Todo o dizer autêntico não só diz algo, como o diz alguém a alguém * (2)

"quando o homem se põe a falar fá-lo porque crê que vai poder dizer quanto pensa. Pois bem, isto é ilusório. A linguagem não dá para tanto. Diz, pouco mais ou menos, uma parte do que pensamos e põe uma vala infranqueável à transfusão do resto. Serve bastante para enunciados e provas matemáticas; já ao falar da física começa a tornar-se equívoca e insuficiente. Mas à medida que a conversa se ocupa de temas mais importantes que esses, mais humanos, mais "reais", vai aumentando a sua imprecisão, o seu entorpecimento e a sua confusão. Dóceis ao preconceito inveterado de que falando nos entendemos, dizemos e ouvimos tão de boa-fé que acabamos muitas vezes por nos mal-entendermos muito mais do que se, mudos, nos procurássemos adivinhar"

(*) Cf. modelo comunicacional da retórica aristotélica
(**) Ortega y Gasset, (2007), A Rebelião das Massas, Lisboa: Relógio D'Água, p. 8