25 julho 2008

O perigo nuclear e os outros perigos

A propósito da energia nuclear, noto que as diferentes reacções que a proposta do Governador do Banco de Portugal espoletou parecem centrar-se todas na iniciativa empresarial ou na política económica do Governo, o que, como é natural, afunila a discussão para a mera análise de custo/benefício. A ideia que pode ficar é a de que é aí que se centram as grandes dúvidas ou a fonte de todas as indecisões e adiamentos do nuclear em Portugal. Mas não creio.

Acredito mais que seja o factor perigo, que sempre surge associado à instalação dos respectivos reactores nucleares, alguns dos quais nos deixaram trágica memória. Parece-me mesmo estranho que ninguém assuma este factor perigo e o correspondente receio que o nuclear ainda gera nas populações. Se ter próximo de casa uma lixeira ou um simples aterro sanitário já incomoda muita gente (como se tem visto), ficar com uma central nuclear por perto será de pôr os cabelos em pé.

Simplesmente este é um problema com que temos que aprender a conviver, estudando, caso a caso, as soluções mais justas para todos. O debate sobre o nuclear é que não pode continuar sistematicamente adiado. E talvez ajudasse meter na cabeça que outros perigos se acrescentam agora, porventura, ainda mais devastadores e menos controlados, do que o risco do nuclear. É, pelo menos, o que já há quatro anos escrevi no livro que aqui venho pós-publicando:
"Contrariamente ao que acontecia no séc. XX com as armas nucleares, biológicas e químicas mais as tecnologias que as sustentavam e que implicavam actividades de grande porte, matérias primas raras e informações protegidas, as tecnologias do séc. XXI estão perfeitamente ao alcance dos indivíduos ou de pequenos grupos, não carecem de grandes instalações nem de matérias primas raras, pelo que é possível utilizá-las recorrendo apenas ao conhecimento. Logo, são ainda mais perigosas."
in Américo de Sousa (2004), O homem com medo de si próprio, Porto: Estratégias Criativas, p. 92