20 abril 2008

Divórcio partidário

Só agora reparei que no último programa "Falar Claro" da Rádio Renascença, Manuela Ferreira Leite terá defendido algo e o seu contrário ao afirmar, por um lado, que espera "que o PSD prometa e anuncie que, se for Governo, imediatamente altera a lei" (*) (apresentada pelo PS para acabar com o divórcio litigioso) e por outro, que "legislar sobre o divórcio não é uma necessidade da sociedade" (*). Em que ficamos, afinal? Se não é necessário legislar sobre o divórcio para que quer então Manuela Ferreira Leite alterar a lei logo que o PSD volte ao Governo? É a própria quem desfaz toda a dúvida: para que as pessoas percebam que não é a mesma coisa votar no PS ou no PSD (*). Eu só pergunto: haverá razão mais pequenina?

(*) Cf. Público 14 Abril 2008

Cavaco elogia obra para não falar do autor


Cavaco sabe que Jardim foi longe de mais, quando muito "respeitosamente" o tratou por sr. Silva.

Cavaco sabe que Jardim foi longe de mais, quando chamou de "bando de malucos" aos deputados da oposição na Madeira.

Cavaco sabe que Jardim foi longe de mais, quando o impediu, é o termo, de ser recebido pela Assembleia Legislativa, em sessão plenária.

Sabendo Cavaco tudo isto (mais o que agora não vem ao caso) fica a sensação de que também ele foi longe de mais ao remeter casos de grosseiro desrespeito das instituições e dos titulares de cargos políticos para o baú do mero (e desculpável) estilo. Não que se questione o invocado direito à reserva em nome da eficácia política, mas porque nem tal direito é ilimitado nem a tanto obrigaria. Um coisa é evitar a condenação pública que sempre pode incendiar ainda mais os ânimos, outra, bem diferente, é engolir sapos vivos e, mesmo assim, ficar tecendo os maiores elogios. Razão tem
Vital Moreira quando, por analogia, pergunta:

"Se porventura um primeiro-ministro da República se referisse aos deputados nacionais da oposição como 'bando de malucos' e a AR como lugar de má reputação, será que o PR consideraria isso tolerável?"

Quanto à (não) ida à Assembleia Legislativa,
Medeiros Ferreira já disse tudo: "É inconcebível que [o PR] tenha aceite essa diminuição do seu papel e o do parlamento".

Novidade, novidade, é Cavaco ter recorrido à retórica do elogio à obra para não falar do autor. Nada mau para quem ainda há tempos punha a retórica na prateleira das inutilidades.

19 abril 2008

Uma história de desencantos

Com um título que rasga toda a indiferença, aí está o livro de António Oliveira. A apresentação da obra e do autor foi ontem, no Auditório do ISLA/Vila Nova de Gaia e esteve a cargo do Prof. Dr. Sérgio de Matos da Universidade do Porto. Cheguei atrasado, mas ainda pude dar um abraço ao António com quem tenho partilhado algumas das minhas mais persistentes indagações.

Felizmente que a EdiumEditores anuncia para a próxima 2.ª feira, dia 21, pelas 17,30 h uma nova apresentação, na Biblioteca Florbela Espanca, em Matosinhos, com o jornalista João Paulo Menezes. Desta vez garanto, António: serei dos primeiros.
Se não tivesse visto não acreditava: o António Oliveira de gravata.

Auditório cheio e muito interessado

18 abril 2008

O divórcio fácil

"O que o PS quer é o divórcio fácil" - terá dito o meu ilustre amigo e deputado Montalvão Machado. Mas aqui que ele não me lê, o que realmente nunca entendi é por que razão deve o casamento ser mais fácil do que o divórcio. Alguém sabe explicar?

11 abril 2008

O caso do falso professor verdadeiro

Segundo João Bonzinho, no "Sexta" de hoje, o cidadão António Ramalho Raposo de 53 anos foi esta semana condenado a 18 meses de prisão com pena suspensa por ter dado aulas de educação física e de matemática durante 30 anos, chegando mesmo a presidente do conselho executivo da escola Cristóvão Falcão (entre 2001 e 2006) à custa do recurso a "certificados de habilitações que nunca teve".

Confirmado agora que não era quem dizia ser, nem tinha direito aos diplomas que forjava, o professor não podia ser mais falso. Cometeu um crime pelo qual foi condenado e, como é natural, foi também expulso da Função Pública. O problema é que como relata João Bonzinho, foi elogiado em pleno tribunal por professores, auxiliares de educação e antigos alunos que o classificaram como "docente exemplar, que sempre desempenhou na perfeição as suas funções" - elogios que não estarão, por certo, ao alcance de muitos professores verdadeiros.

O António Raposo pode então ter sido muito mais um "falso professor verdadeiro" do que um "verdadeiro professor falso". Depois, como diz João Bonzinho, "é tramado que [o António Raposo] se veja expulso após tão bons serviços prestados". Mas é a vida.

08 abril 2008

O empenhamento dos portugueses


Há quanto tempo não me deparava com um cartaz deste género? Bom. Não seria bem nisto que José Socrates estava a pensar
quando afirmou que o sucesso da Iniciativa Novas Oportunidades exigia o empenhamento de todos. Mas assim para já, para já, em matéria de empenhamento, é o que se pode arranjar.

07 abril 2008

Não gosto de andar de avião

Já voei alguma coisa e continuo a voar. Mas confesso que nunca tive lá em cima a mesma sensação de segurança que tenho cá em baixo, por exemplo, quando viajo de carro. Ao princípio diziam-me que isso era natural nas primeiras viagens mas que passaria com o tempo. Resolvi então afrontar o "monstro": fiz Porto-Lisboa-Porto; Lisboa-Faro-Lisboa; Porto-Nova Iorque-Porto; Porto-Miami-Porto; Porto-Luanda-Porto; Porto-Madrid-Paris-Zurique-Milão-Munique-Amesterdão; Amesterdão-Dubai-Amesterdão. Voei para mais um bom punhado de destinos. E nada. Tudo continua igual: não gosto de andar de avião.

Medo de voar ?

O mais engraçado é que nem se pode dizer que tenha medo de voar (ok, riam-se), ao menos naquele sentido irracional de quem não consegue embarcar ou de quem faz das tripas coração e embarca mas passa o voo a certificar-se minuto a minuto de que o aparelho ainda não caiu. Não. Estou muito longe de me aproximar do avião como quem vai para a cadeira eléctrica e uma vez lá dentro, não sou nada dado a maus pressentimentos, nem sofro de qualquer tipo de achaques ou falta de ar. Antes pelo contrário, como passo a descrever.

Um “passageiro normal”

"Amarrado" ao assento ou passeando pela aeronave, represento a preceito o meu papel, comportando-me como um passageiro "normal", que é como imagino que aquela comunidade de circunstância (a do mesmo voo) espera que eu me comporte. Nada de mais, só um pouco de teatro social para, na esteira do nosso Primeiro-Ministro, disfarçar os meus estados de alma. Creio que não me tenho saído nada mal dessa "representação". Ao menos aí, mostro-me à altura nas alturas, já que dentro do bicharoco sou apenas mais um a "transmitir" aos outros a ideia de que a viagem é uma coisa trivial e até relaxante. Isso, sim, diverte-me, só de pensar em quantos mais irão ali, calados que nem um rato, a fazerem a mesma figurinha que eu.

O argumento estatístico da perigosidade

Ao que não acho muita graça é à comparação do risco de acidente lá em cima com o risco de acidente cá em baixo que é o que faz o tão matraqueado argumento estatístico, ao partir do princípio de que conduzir um carro é mais perigoso do que andar de avião. Embora a versão mais popularizada deste argumento se apoie apenas na ideia geral e muito intuitiva de que se dão bastante menos acidentes de avião do que acidentes de carro, há quem chegue a quantificar essa comparação, o que, naturalmente, dá ao argumento uma aparência ainda mais persuasiva. Será o caso do matemático Nuno Crato quando defende que o carro é 65 vezes mais perigoso do que o avião, como refere João Pereira Coutinho na sua penúltima crónica na Única/Expresso. Coutinho que, por sinal, discorda desta visão calculista de encarar o medo de andar de avião pois não é o saber que resolve a angústia do condenado e, acrescenta ainda, "como diria Henry James, mais forte do que a matemática é a imaginação para o desastre". Não posso estar mais de acordo. Por mais dignidade científica que se reconheça, como se reconhece, à matemática, não se pode reduzir a explicação do aparecimento do medo (seja do que for) a uma mera expressão quantitativa. Basta lembrar que não tem medo quem quer pois, por natureza, o medo não deriva da vontade, não resulta de uma decisão. Logo, saber que andar de carro é 65 vezes mais perigoso do que andar de avião pode não ser suficiente para fazer desaparecer o medo.

A perda máxima provável

Sobra ainda o caso daqueles que (como eu?) não tendo propriamente medo de andar de avião também não podem afirmar que algum dia foram felizes durante um voo. A minha hipótese é a de que o desconforto, chamemos-lhe assim, seja aqui de carácter acentuadamente racional. Porque do que duvido é do rigor e da adequação deste cálculo estatístico que a toda a hora me é exibido como argumento, razão suficiente ou evidência das evidências de que “o avião é o meio de transporte mais seguro”. Primeiro, porque se há mais acidentes de carro ou se o acidente de carro é muito mais provável do que o acidente de avião (o que não é bem a mesma coisa), a verdade é que da esmagadora maioria dos acidentes de carro ou não resultam sequer feridos, ou resultam apenas feridos sem gravidade ou feridos com gravidade, enquanto que num desastre de avião a probabilidade de morrerem todos os passageiros e respectiva tripulação é, como se sabe, praticamente de 100%. Daí que a “perda máxima provável” no avião seja infinitamente superior à “perda máxima provável” no carro. Não será então racional, ao menos deste ponto de vista, considerar o avião mais perigoso do que o carro? Em segundo lugar, será preciso definir previamente o que se quer dizer com a expressão “mais perigoso”. Por outras palavras, o que significa afirmar que a condução de um carro é 65 vezes mais perigosa do que andar de avião?

1) Que há 65 vezes mais acidentes de carro do que acidentes de avião?

2) Que os acidentes de carro são 65 vezes mais graves do que os acidentes de avião?

3) Que a probabilidade de ocorrer um acidente de carro é 65 vezes maior do que a de ocorrer um acidente de avião?

Sendo obviamente de rejeitar a ideia de que um maior número de acidentes é uma prova automática de maior perigosidade, seria quase uma obra de caridade se o professor Nuno Crato ou qualquer outro credenciado defensor do argumento estatístico, pudesse explicar, passo a passo, como se chega à conclusão de que a perigosidade do carro é 65 vezes maior do que a do avião. Quem sabe se o meu desconforto tem cura?

06 abril 2008

Letras pequeninas


Bem sei que o livro é gratuito, que o formato é de bolso e que o talento de Eça está todo lá dentro. Mas quem no seu perfeito juízo vai ler um livro numa letra tão pequenina? Faz lembrar aquela letrinha das antigas apólices de seguros. Só que estas, ao contrário do livro, não tinham como principal objectivo serem lidas. Resultado: abri o livro e pousei-o imediatamente, duplamente frustrado. Por um lado, por me privar da sua leitura; por outro, pela indelicadeza de recusar um presente. Peço, por isso, desculpa ao JN, mas na próxima, espero que pense melhor no que me vai oferecer. Não quero voltar a sentir-me tão ingrato como me senti desta vez.

03 abril 2008

O seu a seu dono

Não tencionava referir-me à mediatizada luta (passe o exagero) que aluna e professora travaram na sala de aula. Mas já é tal o chinfrim à volta do assunto que corria o risco de ser o único a não dar palpite. Sem querer beliscar a profundidade pedagógica dos "especialistas" que vão buscar as causas bem longe da própria escola, faço apenas uma pergunta:

-Porque é que a professora não devolveu logo o raio do telemóvel à aluna?

02 abril 2008

Deslize ou empurrão?

"Os socialistas madeirenses lembram que Jaime Gama chamou Bokassa (o ditador africano) a Alberto João Jardim há 16 anos e que agora lhe elogia a obra e o trajecto; ora, 16 anos são uma eternidade que pode ter mudado quer Jardim quer Jaime Gama. Pelo que conheço de Jardim, não parece que se tivesse alterado muito do perfil e da substância da sua figura política; já de Jaime Gama não sei, mas tenho as minhas impressões – e uma delas é a de que o presidente do Parlamento (e segunda figura do Estado) não costuma dar ponto sem nó, ou seja, nunca é inocente num deslize, se se trata de um deslize. Jaime Gama a elogiar Jardim significa que ignora o partido – e que Jardim deve ser reanalisado."

Francisco José Viegas

Muito bem visto. O Francisco começa por lhe chamar deslize mas logo adita: "se se trata de um deslize". E adita muito bem. A mim, por exemplo, parece-me mais premeditado empurrão (falta saber para onde). Porque ninguém passa, sem querer, do insulto ao elogio, muito menos quem "não costuma dar ponto sem nó". Além de que se 16 anos são para a política uma eternidade, já para a memória podem reduzir-se a um breve instante. O tempo que o diga.

01 abril 2008

A fé no dia de amanhã

"Hoje tenho fé, amanhã não sei, não depende da nossa vontade"

Daniel Serrão
in JN, 01.03.2008

Quer dizer que é possível ter fé no dia de amanhã sem ter fé no dia de amanhã? Boa. Nunca tinha pensado nisso.