28 fevereiro 2007

Sucata evocativa

Velha locomotiva na Estação do Pocinho (Vila Nova de Foz Coa)

27 fevereiro 2007

Nem a primeira nem a segunda nem a terceira

Este país só está bom para os vigaristas! - clamava uma ouvinte, esta manhã, no forum da TSF. O mal não é o exagero. O mal é que não é a primeira nem a segunda nem a terceira pessoa a quem escuto um desabafo destes.

25 fevereiro 2007

Quadros do meu passeio de domingo

Belo domingo, o de hoje. Fui com a família e amigos a Vila Nova de Foz Coa. Almoçamos no Pocinho, no Restaurante Miradouro, do amabilíssimo sr. Joaquim. Nunca vou esquecer o invulgar cálice de vinho do Porto, de produção particular, com que nos brindou enquanto esperávamos pelo apetitoso assado de borrêgo da região. Terminado o repasto, foi a vez de abrirmos os olhos para a impressionante beleza natural daquelas terras do Alto Douro pejadas, sobretudo, de vides, oliveiras e amendoeiras. Nesta época do ano, então, as amendoeiras em flor tornam a paisagem tão soberba que chega a parecer saída da tela de um genial pintor. Bati mais de quarenta fotos e agora estou aqui a olhar para cada uma delas como quem aprecia um quadro, neste caso, um quadro naturalista. Dêem uma vista de olhos às que aqui deixo e digam lá se é ou não um excelente destino para um passeio de Domingo:


24 fevereiro 2007

Excerto de um livro não anunciado (366)

Mas a afirmação de que as diferenças entre uma e outra serão mais de grau ou intensidade do que de natureza, ganhará em rigor e possibilidade de aplicação prática, se a fizermos incidir fundamentalmente sobre a fase do processo hipnótico em que o sujeito permanece no estado de vigília. Ou seja, aquele maior ou menor lapso de tempo que decorre entre o início da chamada indução hipnótica e o “mergulhar” no estado de hipnose. Porque é aí que se joga o sucesso ou o fracasso da sessão hipnótica, que a eficácia das técnicas usadas pelo hipnotizador será submetida à prova de fogo, que a força persuasiva dos seus “argumentos” ditará ou não a “adesão” do paciente. É verdadeiramente nessa fase que a hipnose se mostra passível de confronto com a situação persuasiva em que tem lugar a retórica. Pela simples razão de que para que se possa falar de persuasão será sempre necessário que se verifique uma condição: que a pessoa a quem queremos persuadir não esteja já (por sua própria iniciativa) na disposição de pensar o que pretendemos que pense ou de agir como intentamos que aja. Não persuadimos a caminhar quem já se encontra a fazê-lo ou com predisposição para o fazer. E, por conseguinte, também não podemos falar de persuasão a partir do momento em que o sujeito está hipnotizado, pois aí, o natural enfraquecimento das suas defesas psíquicas e físicas leva a uma anormal redução da capacidade crítica que mantém habitualmente no estado de vigília. Nesse estádio da hipnose, o sujeito já está predisposto para aceitar a sugestão, para a pôr em prática sem a submeter ao crivo do seu raciocínio, pelo menos nos moldes em que o faria antes da respectiva indução hipnótica.

22 fevereiro 2007

Sem catequese

Sendo a liberdade um valor tão importante para a nossa civilização, a próxima questão é, naturalmente, a de saber quem criou este ideal. A resposta é: Jesus Cristo. Na realidade, o cumprimento das nossas obrigações para com os outros e para com nós próprios é a mensagem essencial do cristianismo.

Prof. Pedro Arroja, Blasfémias

Isto pode parecer retórica mas não é. É tão só uma aparência de retórica. E é uma aparência de retórica porque se conclui para além do que as premissas autorizam. Poderia ser apenas um mau argumento se a conclusão fosse pouco plausível. Mas na verdade, nem argumento é. E o prof. Arroja sabe-o melhor do que ninguém.

Tenha lá santa paciência, professor, mas da premissa de que "O cumprimento das nossas obrigações para com os outros e para com nós próprios é a mensagem essencial do cristianismo", não se segue que o criador do ideal de liberdade tenha sido Jesus Cristo. Ou segue? Deixemos, por isso, a catequese para outro departamento, que o mesmo é dizer, para outro lugar.

Excerto de um livro não anunciado (365)

Tal modificação, no entanto, varia de intensidade conforme o contexto, o tipo de relação e os efeitos visados em cada situação interaccional. O que equivale a dizer que “certos tipos de relações interpessoais provocam um estado de consciência modificada mais profundo do que outros. É o caso de situações onde a relação é notoriamente complementar: relações pais/filhos, patrão/empregado, juiz/arguido, comandante/soldado e, entre outras, a relação médico/paciente” (*). A relação orador/auditório não pode pois deixar de ser igualmente compreendida à luz da modificação do estado de consciência que nela e por ela se opera, ainda que sem a profundidade que caracteriza a relação hipnotizador/hipnotizado. Neste sentido, o acolhimento da definição avançada pela Comissão da British Medical Association, constitui, por si só, um primeiro enquadramento da nossa hipótese na similitude estrutural e figurativa em que pensamos a retórica e a hipnose.

(*) Mambourg, P.-H., "Du rôle de l’hypnose dans la formation des thérapeutes", in Michaux, D. (Org.), (1998), Hypnose, Langage et Communication, Paris: Editions Imago, p. 209

21 fevereiro 2007

Uma maneira de falar

Ser arguido não quer dizer nada.

Disse agora mesmo o sr. Procurador-Geral da Republica, Pinto Monteiro, ali na RTP1, em entrevista conduzida por Judite de Sousa. Com o devido respeito, não teria sido mais apropriado lembrar antes que "ser arguido não quer dizer tudo"?

20 fevereiro 2007

Em defesa do referendo com que não concordei

Disse o sr. Presidente da República que o referendo "pode ter causado rupturas" na sociedade portuguesa. Daí que, a confirmar-se o mau prenúncio, fosse caso para dizer: amaldiçoado referendo. Mas não. O referendo não tem esse poder. O referendo não causou quaisquer rupturas na sociedade portuguesa. Quando muito, mostrou-as. E se as mostrou é porque já existiam à data da votação. A verdadeira causa de tais rupturas somos nós, não o referendo.

Precisamos de pensar e sentir melhor, de estudar, de reflectir e debater em comunidade, mas sem cair em "campeonatos" ou "fanatismos" morais. Uma boa regra talvez fosse a de nos concentrarmos mais na defesa dos nossos pontos de vista do que no ataque às ideias dos outros, isto é, reanalisando as nossas próprias convicções e as razões e sentimentos que até elas nos conduziram, em vez de dispararmos logo a "artilharia pesada" contra as hostes do "inimigo", aqui representado por todos os que pensam diferente. Ou seja, fazer precisamente o contrário do que vimos na maioria dos debates da recente campanha para o referendo, onde mais do que contribuir para a descoberta da melhor solução, cada uma das partes, regra geral, apenas defendia a sua "matraqueada" proposta.

É difícil? É. Mais dificil do que culpar o referendo. Mas também é "só" isso: difícil.

19 fevereiro 2007

Excerto de um livro não anunciado (364)

Seja, porém, qual for o desfecho desta polémica, notemos que ela se centra muito mais sobre a causa primeira da hipnose do que nas condições e factores que lhe dão origem, para além de igualmente não questionar a positividade dos seus efeitos. Estes últimos viriam mesmo a ser devidamente certificados, em 1959, quando a Comissão da British Medical Association estabeleceu a seguinte definição:

[A hipnose é] ...um estado passageiro de atenção modificada no sujeito, estado que pode ser produzido por uma outra pessoa e no qual diversos fenómenos podem aparecer espontaneamente ou em resposta a estímulos verbais ou outros. Estes fenómenos compreendem uma modificação da consciência e da memória, uma susceptibilidade acrescida à sugestão e o aparecimento no sujeito de respostas e ideias que não lhe são familiares no seu estado de espírito habitual (*)
.

Se atentarmos bem nesta insuspeita definição, não poderemos deixar de descortinar uma assinalável semelhança entre a descrição nela contida e o que em grande parte se passa no processo de persuasão inerente a toda a situação retórica. É que, como diz Mambourg, “toda a interacção entre duas pessoas conduz a uma modificação do estado de consciência e a respostas diversas e imprevisíveis como o riso, o choro, a cólera, a empatia, os envolvimentos públicos ou secretos, o sofrimento, o prazer, etc.” (**)

(*) Chertok, L. (1989), L’hypnose, Paris: Éditions Payot, p. 32
(**) Mambourg, P.-H., "Du rôle de l’hypnose dans la formation des thérapeutes", in Michaux, D. (Org.), (1998), Hypnose, Langage et Communication, Paris: Editions Imago, p. 209

18 fevereiro 2007

Há coisas que não mudam mesmo


O mundo mudou. O mundo é Público. A sociedade mudou, a política mudou, a opinião e a economia mudaram. Tudo mudou excepto o desleixo que levou a que na edição do Expresso do dia 17 o Público ainda anunciasse: "Segunda, dia 12, o seu novo jornal está nas bancas". Há coisas que não mudam mesmo.

Meça as suas atitudes

Será possível "sondar crenças que nem a reflexão mais íntima é capaz de reconhecer"?

A julgar pela entrevista que concedeu ao Notícias Magazine (edição de hoje) o psicólogo social Félix Neto acredita que sim, que é possível medir atitudes através do teste TAI (Teste de Associação Implícita).

O TAI é um questionário online concebido por três investigadores da Universidade de Harvard, no âmbito do "Projecto Implícito" sendo Félix Neto, o responsável pela adaptação portuguesa. Atentas as credenciais dos autores, dispus-me a fazer o teste. Mas não correu nada bem.

Tenho o maior respeito pelo Prof. Félix Neto que foi, aliás, meu professor num mestrado de relações interculturais. Mas em se tratando de investigação científica, não conheço melhor forma de colaborar do que dizer o que penso (ou o que sinto, como diria Hume) deste teste, depois da minha primeira tentativa. Ora a coisa pareceu-me tão irritante e demorada que seria preciso não fazer a menor ideia de quem sou para me prestar, de bom grado, a tão constringente tarefa. Acredito que não seja ainda o caso...

Estaria eu demasiado impaciente? Terei formulado excessivas expectativas? Pode ser. Por isso tentarei de novo. Entretanto, se quiser ver de que lado está a razão, faça você mesmo o teste. Afinal, é só clicar aqui.

17 fevereiro 2007

Excerto de um livro não anunciado (363)

Esta afirmação carece, no entanto, de um prévio esclarecimento sobre a particular acepção de hipnose (1) que aqui acolhemos. Por um lado, porque até ao momento, “não existem teorias exaustivas que expliquem a hipnose.Todas as teorias são parciais. Cada uma fornece uma explicação a um certo nível” (2) e por outro, porque mesmo no domínio terminológico, subsistem distinções cuja relevância varia de autor para autor (3). Subjacente a esta falta de unidade teórica sobre a hipnose, está uma questão que permanece por resolver: a de saber se o estado hipnótico “contém algo de específico ou unicamente os elementos introduzidos pelo hipnotizador” (4). Para uns (5), a hipnose não é mais do que sugestão. Para outros, é de admitir “a existência específica de um estado hipnótico assente sobre uma base quase orgânica” (6) chegando Chertok a defini-lo como um “quarto estado do organismo, actualmente não objectivável (ao inverso de três outros: a vigília, o sono, o sonho): uma espécie de potencialidade natural, de dispositivo inato....” (7).

(1) Referir-nos-emos aqui, sobretudo, à hipnose psicoterapêutica, por corresponder, incontestavelmente, ao campo de aplicação mais testado pela investigação científica.
(2) L. Chertok (1989), L’hypnose, Paris: Éditions Payot, p. 35
(3) Situação muito análoga ao que se passa com a investigação experimental da persuasão.
(4) L. Chertok (1989), L’hypnose, Paris: Éditions Payot, p. 33
(5) Bernheim e seus seguidores.
(6) L. Chertok (1989), L’hypnose, Paris: Éditions Payot, p. 33
(7) Ibidem, p. 260

15 fevereiro 2007

Jornais sem notícias?

Joaquim Oliveira demitiu as direcções do Diário de Notícias e do 24 Horas devido "aos fracos resultados dos dois diários". Não é ainda uma confirmação de que o bom jornalismo é o que dá milhões, mas já estivemos mais longe. A continuar assim, ainda iremos ter jornais sem notícias. Desde que sejam rentáveis... claro.

Excerto de um livro não anunciado (362)

O modelo hipnótico da persuasão

Parecerá surpreendente ou até despropositado chamar a hipnose a um estudo sobre a retórica - enquanto técnica de persusão discursiva - principalmente quando se pretende privilegiar a sua dimensão crítica. É que o simples enunciar da palavra hipnose pode remeter-nos, tão somente, para um cenário de submissão, de interrupção dos processos lógicos e enfraquecimento da vontade de um sujeito (hipnotizado) que sucumbe à manipulação mais ou menos autoritária de outro (hipnotizador). A hipnose estaria pois nos antípodas da nova retórica, pelo que a pertinência da sua convocação resumir-se-ia, quando muito, a uma utilidade meramente comparativa. E ainda assim, apenas para ilustrar o que a retórica não é, nem deve ser. A hipótese que aqui queremos formular vai, porém, num outro sentido. Funda-se na convicção de que, sob o ponto de vista da relação com o outro, logo, ao nível comunicacional, entre retórica e hipnose as diferenças serão mais de grau ou intensidade do que de natureza.

Que falta de persuasão

Pela terceira vez consecutiva, o treinador de futebol do Benfica declara no final do jogo que "a bola não quis entrar". É caso para dizer: que falta de persuasão.

13 fevereiro 2007

O estranho choque tecnológico

Que estranho choque tecnológico: quase três semanas sem poder responder a um e-mail, editar o blogue, consultar a web, ligar o MSN, etc. O que era e o que nao era, muito tardou a saber-se. Parecia um jogo de ping-pong: da Telepac para a PT, da PT para a Telepac, da Telepac para a PT, da PT para a Telepac... até que um técnico mais zeloso (ou sabedor) da PT resolveu procurar na própria empresa o que não encontrava cá em casa: a causa do problema. E acertou: "era da central", disse pouco depois quando simpaticamente me telefonou a garantir que já estava tudo em ordem. E estava. Convenhamos, porém, que, em 2007, com o tecnológico a dar tanto choque na boca do Governo, já não se admite que empresas como a Telepac e a PT Comunicações demorem praticamente três semanas a detectar e resolver uma anomalia que tem origem nas suas próprias instalações.

11 fevereiro 2007

Telepac avariada

Mais de quinze dias depois de ter reclamado, o meu problema de falta de acesso continua igual ou pior. Com uma agravante: a Telepac diz-me que não é nada com ela, que tenho é de reclamar à PT Comunicações e esta última, por sua vez, já mandou cá a casa um técnico que, depois de mil testes e medições, me garantiu que a "linha" não tem qualquer problema. Entretanto, continuo a pagar a "assinatura" e as sucessivas tentativas (frustradas) de aceder ou de me manter online. Concluo, portanto, que não sou eu que tenho a avaria. É a Telepac que está avariada.

A graça do directo

Depois de nos ter posto a par das mais recentes tragédias que vão pelo mundo, o apresentador da SIC Notícias acaba de anunciar:

"E agora vamos fazer uma curta pausa neste intervalo"

05 fevereiro 2007

Ministra da Cultura com falta de visão

A difícil arte de entrevistar

“A informação não se arranca. No começo queria arrancar literalmente a entrevista. (…) Achava que tinha de me afirmar ali na entrevista e que tinha de fazer tudo acontecer naquela conversa… Também acreditava que iria encurralar o entrevistado de um jeito que ele nunca iria conseguir sair. Esse estilo até pode ser bastante atraente para o grande público, mas, definitivamente, não é a forma mais inteligente para se fazer uma entrevista."

Marília Gabriela in “Notícia Magazine”-JN, 04 Fev 2007

Não sei porquê... estava a ler isto e a lembrar-me de certas entrevistas políticas a que assistimos nas nossas televisões onde o(a) entrevistador(a) fala, fala, fala, mas não deixa o entrevistado falar, pergunta mas já não quer saber, numa estratégia de permanente afrontamento que chega a raiar a indelicadeza ou má-educação. Como diz Marília, o estilo até pode ser mais atraente para o grande público. Do que duvido é que ainda seja jornalismo.



04 fevereiro 2007

Excerto de um livro não anunciado (361)

É certo que, em alguns casos, para persuadir alguém sem qualquer infracção ética, não precisamos sequer de acreditar nas razões que lhe expomos, de reconhecê-las como suficientemente fortes para nos convencerem, bastando que tenhamos a convicção íntima de que são boas para essa pessoa ou por ela vistas como tais. De facto, contrariamente ao pensamento comum, nem sempre é rigorosamente necessário que o vendedor acredite no seu próprio produto. Basta-lhe a convicção de que há pessoas (clientes) para quem esses produtos são, na verdade, a melhor solução, dado o seu particular quadro de crenças e valores. Isto quer dizer apenas que a avaliação da força dos argumentos não pode deixar de ter em conta o perfil dos destinatários da persuasão. Outra coisa é admitir que a persuasão se pode ficar pela dita via periférica, ou seja, prescindir da informação necessária para a apreciação do mérito da questão. Fazê-lo, seria incorrer na manipulação mais grosseira do auditório, um pouco à semelhança do ilusionista que chama a atenção sobre a mão vazia só para esconder o que tem na outra, que mantém fechada. A persuasão discursiva que está no centro da nova retórica reparte-se pelo ethos, pelo logos e pelo pathos mas não prescinde de uma dimensão crítica fundada na ética da discutibilidade. Impõe-se, por isso, reconhecer o primado da via central em todo o acto persuasivo, embora sem menosprezar o importante papel que a via periférica pode desempenhar para a ele se aceder. Deste modo, poderemos encarar estas duas vias como complementares em vez de alternativas, pois a inserção humana e relacional de todo o processo de persuasão fatalmente leva a que, em maior ou menor grau, ambas estejam sempre presentes.

02 fevereiro 2007

Aborto é o referendo

Para além do SIM e do NÃO: dizia ontem o cientista Alexandre Quintanilha (entrevista de Judite de Sousa, RTP1) que em matéria de saber quando começa a vida, ainda só tem dúvidas. Enquanto isso, sintonizo o debate nacional em curso e leio ou ouço os apoiantes dos dois movimentos "de cidadania" (diz-se) a debitarem inabaláveis certezas sobre o assunto. Para uns a actual lei já despenaliza o aborto; para outros a actual lei já não respeita "o valor absoluto da vida" (Vasco Pulido Valente, hoje no Público). E já agora: também nunca vi a metáfora tão maltratada (aborto equiparado ao terrorismo, ao enforcamento de Sadam, etc.). Estou quase a concluir que aborto é o referendo.

A única forma de amor

Repararam naquele excelente artigo que vinha ontem no "Público" sobre Hannah Arendt? Assinado por António Bento, professor de filosofia e comunicação da Universidade da Beira Interior, nele se evoca e recupera a indeclinável utopia de Arendt em querer depurar a análise política de qualquer filosofia, quando parece que o que ela própria mais faz é depurar a filosofia de toda e qualquer política:

"Nunca na minha vida 'amei' um povo ou um grupo - nem o povo alemão, nem o povo francês, nem o povo americano, nem a classe operária, nem nada disso. De facto, amo apenas os meus amigos. E a única forma de amor que conheço e na qual acredito é o amor das pessoas."

Arendt confirmando que a razão está do lado de Hume e de tantos outros: o amor dá-se mal com as abstracções.